O caso da Praça (ou Parque) do Pôr do Sol

Por Mateo Murillo, associado da Cidadeapé  

A Praça Coronel Custódio Fernandes Pinheiro – conhecida como Praça do Pôr do Sol – situada no bairro estritamente residencial do Alto de Pinheiros – vem sendo objeto de  polêmico debate. 

Trata-se de um espaço público excepcional, pela vista desimpedida do horizonte que  dispõe e pelos amplos gramados em meia encosta, onde pode-se disfrutar do crepúsculo  do fim de tarde – o que deu origem ao nome pelo qual a praça é conhecida.

Praça do Pôr do Sol em tarde ensolarada. Foto de @kqf78

Usos Atuais

Nos últimos anos, a praça-mirante ganhou destaque metropolitano, chegando a receber  mais de 10 mil visitantes em finais de semana. Só que junto com a fama vieram impactos  à vizinhança residencial, como excesso de lixo, música alta (tanto diurna como noite adentro), comércio irregular de bebidas e comidas, entre outros, além do desgaste precoce dos gramados, não acompanhado de um plano de manutenção adaptado ao  intenso uso em feriados e finais de semana.

Praça do Pôr do Sol – efeitos de usos excessivos/ desregrados. Fotos de Parque Pôr do Sol.

Devido à falta de gestão pública que delimite regras de ocupação e planos de  manutenção condizentes com as atuais demandas, a Praça do Pôr do Sol está em risco  de perder seu encanto – e sua função. 

CERCAMENTO 

De forma atabalhoada e sem a devida transparência, a Prefeitura cercou a praça, que passou a permanecer fechada entre 22h e 06h. Essa medida, da forma como ocorreu,  além de inconstitucional, fere a Lei Nº 16.212, de 10 de junho de 2015, que dispõe  sobre a gestão participativa das praças do município de São Paulo – inclusive através  da criação de comitês de usuários para auxiliar na gestão do espaço.

Cerca na Praça do Pôr do Sol. Foto de Conexão Planeta.

Além disso, está em curso a discussão do Projeto de Lei 01-00454/2021 do Vereador  Xexéu Tripoli (PSDB), que propõe transformar o espaço da atual praça em parque  municipal. Na prática, caso o projeto vier a ser aprovado pela Câmara Municipal, isso  significará retirar da Subprefeitura de Pinheiros a responsabilidade pela manutenção e  gestão da praça, passando esta à Secretaria do Verde e Meio Ambiente. Isso implicaria também na aplicação da Lei Nº 15.910, de 27 de novembro de 2013, que dispõe sobre  a criação e organização de Conselhos Gestores dos Parques Municipais

Na opinião pública paulistana parece haver um falso entendimento que associa parque com cercamento (gradil). Mas não há nenhuma vinculação técnica ou jurídica entre o  fato de um espaço público ser classificado como parque e dele ser necessariamente  cercado. O uso de cercas ou grades (assim como de outros tipos de “barreiras” à  circulação – como cercas vivas, arbustos, guarda-corpos, espelhos d´água, lagos, etc) são  decisões paisagísticas que devem estar associadas a características e demandas  específicas de cada espaço público. 

PRAÇA OU PARQUE? 

A discussão sobre se a Praça do Pôr do Sol deva ser entendida como parque ou praça tem sido travada principalmente de um ponto de vista administrativo – ou seja, sobre  quem deve ser o órgão responsável por ela (a Subprefeitura de Pinheiros ou a Secretaria  do Verde e Meio Ambiente). Mas, independentemente disso, o espaço deve ser tratado  da mesma maneira em relação às suas funções e gestão. Em ambas situações, a  legislação vigente exige uma gestão participativa e transparente – seja como praça ou  como parque – que deverá lidar com os atuais conflitos entre demandas locais e  metropolitanas. 

Piazza del Campo (Siena, Itália) – exemplo clássico de praça. Foto de Brasil na Italia.

Sob uma ótica técnico-urbanística, o conceito de praça guarda uma forte relação de  interdependência com seu entorno. Em sua essência, é uma continuidade dos espaços públicos e das atividades humanas que ocorrem em seu perímetro. Assim, a praça, comparativamente ao parque, é um espaço potencialmente mais integrado ao seu  entorno (não que parques não possam sê-lo). 

Portanto, defendo que, para lidar com os atuais conflitos que ocorrem entre os usos  locais (residenciais) e a crescente centralidade que a Praça do Pôr do Sol vem ganhando,  o caráter de praça – acima abordado – deve ser reforçado

Isso significa aumentar os usos locais em volta e dentro da praça. Significa também melhorar as condições de circulação a pé nos arredores e nos caminhos que a cruzam.

PROPOSTAS 

A praça possui caminhos que a atravessam que, como tais, devem ser preservados e mantidos para uso em qualquer horário. Bloquear essas circulações significa  transformar a Praça do Pôr do Sol em uma nova barreira urbana. Isso diminui o número  de pessoas na rua, gerando um circulo vicioso de insegurança urbana e custos  desnecessários. 

Caminhos pedonais na Praça do Pôr do Sol e entorno

Um caminho possui mais centralidade1 na medida em que ele é mais contínuo e quanto  mais outros caminhos ele cruze. Nesse sentido, ganha destaque o percurso que corta a  Praça do Pôr do Sol quase no seu centro, que se estende desde a Marginal Pinheiros (próximo à Estação Cidade Universitária da CPTM) até o espigão do Caaguaçu (na Av.  Heitor Penteado, próximo à estação Vila Madalena Metrô). 

Percurso contínuo Vale do Pinheiros – Caaguaçu) – em vermelho

Esse caminho é atualmente muito deficiente quanto às suas condições de  caminhabilidade2 e acessibilidade3. Mas possui potencial excepcional4 se readequado  com dimensões e intervenções adequadas e, principalmente, se somado a novos usos  locais. 

Adequações localizadas no uso do solo também seriam fundamentais para reforçar o uso local nas ruas em volta à Praça do Pôr do Sol. Sem alterar a característica residencial e de baixa densidade do bairro, a praça possui uma centralidade que favorece a criação  de uma zona de transição no seu entorno imediato. Isso poderia ser viabilizado através  de incentivos para a criação de térreos ativos, com atividades econômicas e/ou  institucionais compatíveis com o uso residencial existente. 

Para atender às novas demandas e promover seu controle efetivo, a implantação de  novos usos dentro da praça merece ser estudado. Além de instalações para sua  manutenção e vigilância, equipamentos como sanitários públicos e quiosques podem  ser objeto de novos projetos – mas sempre evitando a criação de qualquer nova  obstrução à paisagem. 

Uma maneira de atender essa diretriz seria construir em pequenos cortes na encosta,  criando novos espaços abertos à vista do poente, mas cobertos pelos jardins/ gramados a montante.

Exemplo de novos espaços  

Esse mesmo conceito pode ser utilizado para delimitar e organizar os acessos e a  circulação de pedestres na borda superior da praça. A instalação de gradil ou cerca no  topo da encosta deve ser evitado a todo custo, para preservar a vista desimpedida do horizonte desde a Rua Desembargador Ferreira França. Assim, uma alternativa possível  seria a criação de jardins suspensos (mediante incremento da inclinação das encostas e/  ou construção de lajes-jardim) que impeçam a passagem onde se mostrar necessário, mas mantendo a mesma visibilidade original desobstruída do horizonte.

Exemplo de delimitação de dentro e fora no topo da praça

Na parte inferior da praça, há taludes que, por sua inclinação, já constituem barreiras ao  acesso. Nos pontos onde ainda for possível acesso não desejado, um incremento da  inclinação dos taludes somado à uma vegetação específica (não pisoteável) torna desnecessário o uso de gradis/ cercas. 

Somado as alternativas acima, uma sinalização orientativa e rondas permanentes de  vigilantes/ guarda civil permitiriam um controle da praça e seu entorno muito mais  eficiente e seguro aos pedestres e frequentadores do que cercamentos arbitrários. 

MAS, E OS ABUSOS? 

Para lidar com os excessos causadores de graves desrespeitos ao sossego dos moradores  da vizinhança (independentemente do espaço público ser praça, parque, rua ou  avenida) regras claras e de fácil aplicação devem ser definidas. Não há outra saída. Não  será um gradil ou cerca que vai resolver (podem até atrapalhar). 

Apesar de que acessos bem definidos e uma boa visibilidade ajudem no controle e  aumentem a sensação de segurança para todos, não existe espaço urbano público de  qualidade sem o estabelecimento de regras. Legislação existe. Mas falta uma estratégia clara e única a ser aplicada aos espaços públicos de São Paulo que, aos poucos, consiga  criar um ambiente urbano onde moradores, frequentadores e vizinhanças locais se  respeitem mutuamente, sem necessidade de segregar espaços e pessoas. 

Não se trata de favorecer apenas uma forma de ocupar um espaço. Cada espaço público  tem uma vizinhança específica e perfis de visitantes/ frequentadores diferentes. 

Temos uma lei para a gestão participativa das praças. Também há lei para a gestão  participativa de parques. Há a lei do Plano Diretor vigente, que define parâmetros de  incomodidade urbana segundo zona e horário5. Há também a lei que regulamenta a apresentação de artistas de rua. Mas falta um entendimento prático da aplicabilidade  daquilo que pode e não pode no espaço público – em diferentes horários e medidas. 

Por citar um feliz exemplo de espaço público bem ocupado e administrado, o Bryant  Park (em Manhattan, Nova Iorque) possui regras claras do que pode e não pode. Trata se de uma praça, apesar de cercado por movimentadas avenidas, possui acesso fácil e  um acesso ao metrô. O Bryant Park abriga um grande gramado para desfrute dos  frequentadores e circulações bem definidas sempre abertas ao público. O gramado possui horários em que fecha para manutenção. Na sua última reforma teve seu gramado rebaixado, para ficar mais visível aos olhos dos  transeuntes e implantado um sistema de mobiliários móveis (cadeiras e mesas) que  podem ser livremente utilizados pelos frequentadores.

Bryant Park. Foto em Tins Mush

Figura 10 – Bryant Park – regras. Disponivel em Bryant Park.
Bryant Park – gramado fechado. Foto de Washington Square Park Blog.

O exemplo acima não deve ser entendido como referência a ser seguida indiscriminadamente. Cada espaço é único e como tal, deve criar sua identidade e suas  próprias regras de operação/ gestão e manutenção. 

Mas, em suma, podemos concluir que o projeto do espaço público deve incluir um  desenho consistente e de fácil compreensão que esteja de mãos dadas com um uso consistente e com regras de fácil assimilação e aplicação. 

REFERÊNCIAS 

1 No sentido topológico do termo, onde pode ser entendido como “melhor conectado” com os demais  caminhos (tanto locais como globais/ metropolitanos) de uma dada configuração de circulação. Ver HILLIER, B.;  HANSON, J. “The Social Logic of Space” e “Space is the machine” – Cambridge University Press, 1984. 

2 Qualidade do lugar, correspondente à facilidade para o deslocamento a pé, considerando indicadores como  segurança pública, segurança viária, acessibilidade, condição do passeio, iluminação, atratividade, integração com  transporte coletivo, entre outros. 

3 No sentido da norma NBR 9050 (ABNT). 

4 Principalmente se comparado às condições de caminhabilidade das vias na região do Alto de Pinheiros e no  entorno da Praça do Pôr do Sol, onde predominam a ausência de continuidade dos percursos – seja devido à falta  de faixa livre contínua, falta de travessias sinalizadas para pedestres como pela configuração pouco contínua do  sistema viário.

5 No quadro 4b, anexo da Lei Municipal Nº 16.402 de 22 de março de 2016 

Mateo Murillo é Arquiteto e Urbanista, Consultor em mobilidade e colaborador da Cidadeapé

Propostas para o PIU Minhocão

A Prefeitura iniciou o processo participativo para definição das propostas para o Parque Minhocão e divulgou em 17 de maio a primeira consulta pública online para colher contribuições da sociedade civil. Nessa etapa, a população teve acesso ao diagnóstico preliminar da área a ser requalificada e participar com sugestões ou recomendações a respeito do que deve ser incorporado ao projeto até 14 de junho.

A Cidadeapé, junto com o Instituto de Arquitetos do Brasil – Departamento São Paulo e a Repep – Rede Paulista de Educação Patrimonial, enviou  sugestões para a consulta.

Diante da apresentação do projeto do PIU Minhocão pela Prefeitura e da Lei Municipal nº 16.883/18 reforçamos, em primeiro lugar, os avanços ambientais e urbanísticos contidos na proposta apresentada, em razão da importância da desativação total da circulação de automóveis no Elevado e a democratização do acesso aos espaços públicos da cidade.

É preciso destacar a complexidade que este projeto implica, por ser um território no qual incidem múltiplas dinâmicas sociais, imobiliárias, ambientais, habitacionais, culturais, de mobilidade e de valorização do patrimônio cultural, bem como ampliar o acesso e dar maior transparência ao processo.

Para tal as três organizações sugerem em primeiro lugar a realização de testes de desativação (em momento oportuno, tal como férias escolares) de forma a buscar uma solução democrática e gradual, que permita analisar os impactos no processo de equalização do fluxo de veículos decorrente desta desativação e sem prejudicar o transporte coletivo e o fluxo de pedestres, bicicletas e de outras modalidades de transporte ativo.

Entre os tópicos abordados nas sugestões, estão:

  • Diagnóstico da área
    Análise das transformações no perfil socioeconômico ao longo do tempo, levando em conta também vulnerabilidade social, levantamento de cortiços e pensões e moradores de rua
  • Instrumentos de controle e captura de valorização imobiliária
    Conforme determinado no Art. 4º da Lei Municipal nº 16.833/18 e recomendado pelo Ministério Público sugerimos incluir já neste plano a delimitação de um perímetro de captura
  • Habitação social
    Acreditamos que o projeto deva garantir moradia no entorno imediato do elevado para a população de baixa renda que passou a ocupar os imóveis desvalorizados do entorno desde a sua construção.
  • Mobilidade
    Privilegiar os modos coletivos e ativos de transporte aproveitando a ocasião para implantar uma rede racional e conjunta de transporte ativo e coletivo e, ao mesmo tempo, desencorajar o uso do transporte motorizado individual, melhorando assim a qualidade de vida na região Central.
  • Patrimônio cultural
    O território do Minhocão possui uma série de bens culturais protegidos por lei, mas também um patrimônio vivo que faz parte do cotidiano de diferentes grupos sociais e que ainda não foi reconhecido pelos órgãos de preservação.
  • Segurança urbana e privacidade
    Entendemos que a implantação de “biosites” doados pela empresa TIM à SMSU não cabe ser discutida no conteúdo do PIU Minhocão, bem como seria recomendável à Prefeitura desenvolver, previamente e em fórum mais adequado
  • Governança
    Apresentar modelagens de experiências nacionais e internacionais de gestão compartilhada com a sociedade civil de territórios em que incidem instrumentos de reordenamento urbano, considerando sua relação com os Conselho Gestor do PIU Central, das ZEIS e, eventualmente, da AIU constituída, considerando o marco regulatório existente da cidade de São Paulo.

Ver documento completo com todas as sugestões aqui.

Veja comentários de Conselheiras do CMTT aqui.

Imagem do post: Minhocão fechado no domingo em 2014. Foto: Joel Nogueira/Fotoarena/Divulgação

Patinetes elétricos e a mobilidade ativa

Cidadapé se posiciona a respeito dos patinetes como novo modo de transporte  e sua relação com a cidade e os outros modos de deslocamento, sobretudo no que diz respeito aos espaços e prioridades na infraestrutura urbana. 

O uso das calçadas como infraestrutura para a circulação e estacionamento de patinetes elétricos, classificados pela legislação pertinente como equipamentos de mobilidade individual autopropelidos, tem tomado cada vez mais espaço nos debates. Mas é importante lembrar que não se trata apenas de patinetes, trata-se de mais um modo de transporte para a cidades. Para ser eficiente, a mobilidade urbana deve garantir diversidade de opções para realizar os deslocamentos, mas precisa ser sobretudo segura e sustentável. Por isso modos de transporte que ocupam menos espaço e usam energia mais limpa têm prioridade no sistema (cf. PNMU e PlanMob). É necessário melhorar a mobilidade na cidade, preservando a prioridade e a segurança dos mais frágeis. Por isso modos ativos e/ou limpos, como patinetes, são bem-vindos como alternativas de transporte, desde que incorporados ao sistema com segurança e respeito.

O tema dos patinetes ganhou ainda mais repercussão depois de um militar ser atropelado por um carro sobre uma faixa de pedestres enquanto andava de patinete elétrico em 07/05/19 – demonstrando que a fragilidade dos usuários desse veículo se assemelha à de pedestres na cidade. Em resposta, a Prefeitura de São Paulo lançou às pressas um decreto provisório que, entre outras coisas, obriga o uso de capacetes e institui multas para a circulação desses veículos em calçada.

A Cidadeapé se posiciona contra esse decreto que parece ter uma função mais midiática — de mostrar uma aparente capacidade de resposta da Prefeitura a esse suposto problema –, do que efetivamente reduzir conflitos e promover a segurança viária. Os conflitos entre modos de transporte ativos e motorizados são uma das mais importantes questões da mobilidade urbana sendo discutidas com a prefeitura com pouco progresso nos últimos anos, como se observa pelos elevados números de vítimas no trânsito paulistano. É uma discussão que precisa ser feita com seriedade, método e compromisso, e não de forma reativa e imediatista.

A discussão sobre os patinetes em particular teve início em reunião no dia 28 de março, junto às Câmaras Temáticas da Bicicleta e da Mobilidade a Pé (CTB e CTMP). O objetivo era incorporar à regulamentação as reais necessidades dos novos tipos de transporte ativo no contexto da mobilidade paulistana, que ainda não tem infraestrutura apropriada para os modos mais frágeis de deslocamento, em particular a pé e de bicicleta.

Lamentamos que a gestão tenha atropelado o debate, especialmente quando havíamos sido informadas de que haveria discussões públicas antes da publicação do decreto do executivo. De qualquer maneira, estaremos presentes na audiência pública sobre o projeto de lei 01/2019, do legislativo municipal, que propõe regulamentação sobre o Sistema de Micromobilidade Compartilhada, no dia 21/05/2019 a partir das 19h00. Convidamos todos e todas a também participarem!

As raízes dos conflitos

Frente a esse tema, a Cidadeapé ressalta alguns aspectos que deveriam ser levados em consideração quando da regulamentação municipal da operação de novos serviços de transporte: infraestrutura disponível, prioridades de uso das vias (calçadas e ruas) e principalmente a segurança de todos os usuários.

Um dos aspectos se relaciona com a garantia de infraestrutura de qualidade e dos direitos de quem anda a pé.

Segundo padrão definido pela prefeitura de São Paulo para calçadas, elas devem ter uma faixa de circulação e uma de serviços. A de serviços, onde deverá estar posicionado o mobiliário urbano, como rampas de acesso, postes de iluminação, sinalização de trânsito, tampas de bueiro, entre outros, deve ter largura mínima de 70 cm. Já a faixa livre para circulação, com largura mínima de 1,20 m, precisa ser contínua, regular e estar totalmente desobstruída.

Cartilha Passeio Livre: Conheça as regras para arrumar a sua calçada (PMSP)

A faixa livre é o espaço destinado à circulação de pedestres de todos gêneros e idades, inclusive pessoas com todo tipo de deficiência. Na divisão do espaço urbano, estas estruturas que deveriam dar segurança, conforto e eficiência em quase 70% das viagens realizadas diariamente na cidade de São Paulo raramente possuem as qualidades mínimas ou dimensões suficientes para acomodar esse contingente de usuários. Em muitas vias sequer há calçadas. O espaço destinado ao trânsito e estacionamento de veículos motorizados individuais, por outro lado, é bem mais generoso: muito embora sejam responsáveis por apenas 31,2% das viagens diárias da cidade, ocupam ao menos 80% do espaços das ruas (Dados: Metrô: OD 2017).

Ou seja, mesmo que os padrões definidos pela prefeitura estejam de acordo com a Política Nacional de Mobilidade Urbana (PNMU) e o Plano Municipal de Mobilidade (PlanMob), estas definições ainda não saíram do papel. Sem condições de caminhar por calçadas esburacadas, com rampas de acesso a garagens formando degraus, postes e lixeiras atravancando a passagem, não é incomum que pedestres se vejam obrigados a caminhar por onde circulam os automóveis. Esta é uma evidência da demanda urgente por melhores estruturas para caminhar e da necessidade de equalizar suas dimensões, a fim de comportar não só os pedestres mas também a outros tipos de modos de transporte ativos sempre que possível. Sem intervenções significativas nas calçadas, no entanto, é difícil acreditar que as estruturas atuais sejam capazes de atender a uma nova demanda.

Por meio da Resolução 465/13, o Contran estabelece que veículos com as características funcionais e tecnológicas utilizadas pelos patinetes elétricos devem empregar a velocidade máxima de 6 km/h quando circularem em calçadas. No entanto, essa velocidade é superior à velocidade média de quem anda a pé, que pode variar entre 5 km/h e 3,5 km/h, sendo esta a velocidade média de pessoas idosas, com deficiência (PCD) ou restrição de mobilidade. Além disso, os patinetes têm aceleração rápida e um sistema de cobrança por minuto, o que induz seus usuários a desenvolverem as velocidades máximas sempre que possível, podendo atingir 30 km/h. A impossibilidade de fiscalização das velocidades praticadas nas calçadas é mais um agravante, que faz com que na prática os pedestres fiquem sujeitos a dividir o já deficiente espaço das calçadas com pessoas em patinetes circulando a velocidades totalmente incompatíveis.

Por outro lado, é preciso entender por que usuário(a)s de patinete optam por circularem em calçadas em vez de utilizarem a pista junto com os veículos motorizados. Levando em consideração fatores de segurança viária, circular de patinete junto com os carros e motos pode ser muito perigoso e inclusive oferecer risco à vida de seus usuários, como ocorrido no caso do militar atropelado.

Uma discussão abrangente sobre a circulação de patinetes elétricos em calçadas deve levar em consideração ao menos essas questões, a fim de que as soluções possam ser fruto não apenas de critérios técnicos (ou, como neste caso, de reações apressadas), mas também de reflexões que recuperem o histórico de planejamento e de investimento em infraestrutura de mobilidade. Isso porque o acirramento de conflitos relativos à prioridade de uso das calçada não é uma decorrência apenas do surgimento de novas tecnologias em transporte, é principalmente fruto do exíguo espaço destinado às pessoas que se deslocam a pé pela cidade.

A proposta atual não contribui para dar condições realmente efetivas de acomodar o potencial de novos modos de transporte, como os patinetes, e muito menos para preservar a segurança dos pedestres – que continuam sendo o elo mais vulnerável na mobilidade. Assim, mais uma vez, a discussão não deve se restringir somente às características dos equipamentos e limitações de uso, com as responsabilidades pesando apenas sobre as empresas prestadoras de serviços e as pessoas procurando boas alternativas de deslocamento. É essencial  tocar em pontos realmente capazes de acomodar com conforto, eficiência e segurança todos que se deslocam pela cidade, independente do modo, e sobre as responsabilidades do poder público de facilitar a mobilidade urbana e promover a segurança nas vias. Precisamos equalizar os tempos e espaços urbanos, ou seja, diminuir o espaço viário destinado a automóveis, motocicletas e caminhões e as suas velocidades, e restabelecer a prioridade dos modos ativos, qualificando a estrutura para estes.

O que uma regulamentação deveria contemplar?

Em resumo, sugerimos que a regulamentação sobre serviços de compartilhamento de transportes como patinetes deveria contemplar os seguintes aspectos a fim de respeitar a prioridade absoluta a quem se desloca a pé e a segurança de todos:

  1. Acalmamento do trânsito. As áreas onde há maior demanda de viagens por bicicletas e patinetes compartilhados devem ser alvo de ações (de sinalização, geometria e fiscalização) que visem a acalmar o tráfego e reduzir as velocidades desenvolvidas pelos automóveis, a fim de garantir a segurança viária, e de modo que ciclistas e usuários de patinetes possam de fato trafegar pelas vias sem temer por suas vidas.
  2. Uma forma de cobrança que não estimule a velocidade. Ou seja, a regulamentação deveria vedar a cobrança de serviços por minuto, entendendo que isso estimula os usuários a desenvolver velocidades máximas acima do recomendado. A cobrança por distância percorrida pode ser uma opção.
  3. Ocupar espaços de estacionamento nas vias com pontos de apoio. Para evitar o estacionamento de ciclos  (patinetes e bicicletas compartilhadas) em calçadas, que muitas vezes obstruem passagem de pedestres, a Prefeitura deve facilitar a transformação de espaços no leito viário que hoje são ocupados por carros estacionados em pontos de estacionamento para mais tipos de veículos, como bicicletas e patinetes compartilhados, a exemplo do que está fazendo Lisboa. Numa vaga em que cabe apenas um carro, cabem diversas bicicletas e patinetes, ampliando de fato as vagas de estacionamento por veículo ao mesmo tempo em que desestimula o uso de carros.
  4. Restrições para o estacionamento em calçadas. Além de usar os espaços de estacionamento do leito viário, os veículos poderiam estacionar apenas em áreas particulares e na faixa de serviço de calçadas que atendam à largura mínima determinada por lei.
  5. Política de abertura dos dados. Os dados sobre viagens de sistemas de transporte compartilhados são extremamente importantes para os desenvolvimento de políticas de mobilidade urbana. As informações sobre percursos realizados devem ser, portanto, publicizadas pelas empresas responsáveis por esse serviço, de forma a proteger os dados pessoais de seus usuários.
  6. Regulação das áreas de operação. A Prefeitura deve ter a prerrogativa de restringir a operação de serviços de compartilhamento em áreas onde já há saturação de veículos e elevada ocupação das calçadas. E por outro lado estimular a ampliação da cobertura de serviços para áreas com poucas opções de transporte público e coletivo.

Mais sobre o assunto

Imagem do post: Foto: Reuters/BBC

Licitação da Zona Azul adiada até maio

A  Prefeitura de São Paulo decidiu prorrogar para 20/05/19 o prazo para entrega de propostas comerciais da concessão do serviço de  Zona Azul em São Paulo. Isso aconteceu após críticas de diversos órgãos e entidades, incluindo a Cidadeapé e a Ciclocidade, em relação à transparência do processo, o tempo de concessão e principalmente o uso do espaço público.

Cidadeapé e Ciclocidade pediram esclarecimento aos secretários de Governo e Mobilidade e Transporte acerca do planejamento e administração da Zona Azul, em particular como será realizada de fato a governança dos espaços de estacionamento, visto que a cidade está em constante mudança e modernização.

Em 9/4 o Tribunal do Contas do Município apontou 33 irregularidades no edital de licitação, incluindo falta de transparência, necessidade de estudos técnicos e  melhores mecanismos de regulação da concessão “com vistas a preservar o interesse da população efetivado pela implementação de políticas públicas de mobilidade”.

A Cidadeapé continua discutindo o assunto com o poder público por meio, entre outros,  de sua representação no CMTT e na Câmara Temática de Mobilidade a Pé.

Como dissemos em nota pública divulgada no mês de março, tememos que a concessão, por 15 anos, do estacionamento rotativo gere um engessamento do uso do sistema viário da cidade, podendo comprometer obras voltadas para melhorar e completar o sistema de mobilidade urbana, tais como alargamento de calçadas e implementação de ciclovias, faixas e corredores de ônibus.

Mais sobre o assunto:

Caos Planejado: Conceder a Zona Azul paulistana é um erro
O Estado de São Paulo: Zona Azul: uma concessão cinzenta
Folha de São Paulo: Prefeitura prorroga prazo para envio de propostas para concessão do Zona Azul
O Estado de São Paulo: Prefeitura de SP adia processo de concessão da Zona Azul em 40 dias
SP2: Clicloativistas tentam discutir concessão da Zona Azul
R7: Prazo final para a concessão da Zona Azul é adiado por 40 dias

Como a concessão da Zona Azul pode afetar a Mobilidade Ativa

Nota pública – Cidadeapé e Ciclocidade manifestam preocupação com a Concessão de Estacionamento Rotativo na cidade de São Paulo

São Paulo, 29 de março de 2019.

A Cidadeapé e a Ciclocidade vêm por meio desta nota manifestar preocupação em relação ao processo de concessão do serviço de estacionamento rotativo (Zona Azul) no município de São Paulo.

O edital de licitação, na modalidade concorrência internacional, tem como objetivo conceder o serviço de estacionamento rotativo no município por um prazo de 15 anos. O edital desenvolvido pelas Secretarias Municipais de Governo e de Mobilidade e Transportes foi publicado no Diário Oficial da Cidade em 19/1/2019 e os envelopes serão abertos dia 9 de abril de 2019.

Estamos preocupados pelas seguintes razões: 1) passar a exploração das vagas de estacionamento da cidade para uma única empresa privada vai limitar reestruturações viárias necessárias para a melhoria da mobilidade urbana; 2) o prazo de concessão, de 15 anos, é longo demais e não se justifica; 3) faltou transparência e participação social no processo.

Com esta concessão, na prática, o serviço de Zona Azul que hoje é operado pela CET vai ser destinado à iniciativa privada. A nova empresa será responsável por explorar a venda de  cartões e fiscalizar os veículos irregulares, e avisar a CET para multá-los, pois a autuação de trânsito continuará sendo feita por um agente municipalizado.

Em 2017, a Companhia de Engenharia de Tráfego (CET) arrecadou 89 milhões de reais com exploração de estacionamento de Zona Azul, equivalente a 10% de todo o valor recebido pela companhia no ano (Fonte: CET). De acordo com o Plano de Mobilidade de São Paulo (PlanMob/2015), a política de estacionamento da cidade deverá “abordar a provisão do estacionamento para automóvel particular, na via ou fora dela, como um elemento na dinâmica da mobilidade urbana que deve ser gerido em consonância com os demais componentes do sistema de mobilidade”. E prevê, portanto, a elaboração de um plano e estratégia de implantação de gestão informatizada. 

Ao passar para o setor privado o direito de explorar as vagas de estacionamento rotativo da cidade sem um plano prévio, a Prefeitura reduz a possibilidade de usar para outros fins o espaço viário já destinado a automóveis. Isso porque, como o contrato não prevê diretrizes claras para isso, a remoção dessas vagas em determinados locais – para implantar faixas exclusivas de ônibus, ciclofaixas ou estender calçadas, por exemplo – estaria submetida à negociação com uma empresa que lucra com a exploração desse espaço. Conceder o serviço de Zona Azul aumentaria as barreiras – já suficientemente grandes – para a conversão dos espaços de estacionamento nas ruas da cidade em infraestrutura para a mobilidade ativa e o transporte público.

É importante ressaltar que consideramos a Zona Azul um instrumento importante de racionalização do uso do carro. Entendemos que o governo não deve subsidiar o estacionamento gratuito nas ruas, o que é mais uma maneira de privilegiar o transporte individual motorizado, que já ocupa tanto espaço no leito viário. É importante que, quando o estacionamento seja permitido, os veículos particulares paguem apropriadamente pelo espaço público que ocupam. O PlanMob também tem como diretrizes o desestímulo do uso do automóvel, especialmente nas áreas centrais e bem servidas por transporte público. 

Assim, a Zona Azul pode ser um mecanismo para inibir o uso do automóvel, uma versão do “pedágio urbano”. Por meio de uma boa gestão das vagas e dos preços cobrados é possível estimular o deslocamento nessas por outros meios de transporte. A questão é que por ser uma única empresa, e por tanto tempo, o controle da Prefeitura para usar o estacionamento rotativo pago como uma ferramenta para implementar políticas públicas fica muito reduzido. Quando o setor privado passa a ser dono do lucro do espaço, a retirada das vagas para outras destinações é dificultada.

Neste sentido, é importante enfatizar que, de acordo com diretriz da Política Nacional de Mobilidade Urbana (PNMU – Lei Federal 12.587/2012), os modos ativos e o transporte público devem ter prioridade sobre o transporte individual motorizado. E, conforme determina o Plano Diretor Estratégico do município (PDE – Lei Municipal 16.050/2014), os programas, ações e investimentos, públicos e privados, no Sistema de Mobilidade devem ser orientados, dentre algumas diretrizes, no sentido de 1) priorizar o transporte público coletivo, os modos não motorizados e os modos compartilhados, em relação aos meios individuais motorizados; 2) diminuir o desequilíbrio existente na apropriação do espaço utilizado para a mobilidade urbana, favorecendo os modos coletivos que atendam a maioria da população, sobretudo os extratos populacionais mais vulneráveis; 3) promover os modos não motorizados como meio de transporte urbano, em especial o uso de bicicletas, por meio da criação de uma rede estrutural cicloviária; 4) complementar, ajustar e melhorar o sistema de transporte público coletivo, aprimorando as condições de circulação dos veículos;

Para tanto, o município precisa ter à sua disposição poder e flexibilidade para alterar o sistema viário, situação que se complica quando o espaço estiver concedido. De forma concreta, podemos citar que desde 2013 a expansão da rede cicloviária e a expansão de faixas de ônibus envolveram locais em que previamente existiam vagas de estacionamento na via, sendo as vagas rotativas ou não.

A implantação de políticas públicas para uma cidade mais humana passa pela redistribuição equitativa do espaço viário na cidade. Só com mais espaço destinado a modos ativos São Paulo poderá garantir a segurança e conforto de pedestres e ciclistas; assim como só com mais espaço para os ônibus a cidade terá um sistema de transporte público coletivo de qualidade.

Vale destacar que o Plano de Segurança Viária e o Plano Cicloviário, ambos em discussão no momento na SMT e que serão diretamente impactados pela medida, não contemplam a discussão da concessão da Zona Azul.

Outro ponto grave diz respeito à participação social. Em termos de transparência e participação, é de se estranhar que uma discussão tão importante – e de impactos tão grandes – sobre espaço viário e mobilidade não tenha passado pelo Conselho Municipal de Transporte e Trânsito, CMTT, ou sequer tenha havido uma comunicação aos conselheiros. O CMTT, que faz parte da Secretaria de Mobilidade e Transporte, uma da proponentes da licitação, é um órgão colegiado consultivo, propositivo e participativo, que propicia o controle social das ações relativas à mobilidade na cidade de São Paulo. Tem, dentre suas finalidades, a de garantir a gestão democrática e a participação popular na proposição de diretrizes destinadas ao planejamento e à aplicação dos recursos para a melhoria da mobilidade urbana; propor em questões de trânsito  e opinar sobre a circulação viária no que concerne à acessibilidade e mobilidade urbana. Em nenhuma das reuniões de 2018 este tema foi colocado em pauta no CMTT.

Além disso, apesar de o processo licitatório ter seguido ao pé da letra a obrigatoriedade de consulta pública determinada por lei, é patente que uma única audiência pública de 25 minutos, convocada em cima da hora (às 18h14 de uma quinta-feira, para realização às 14h de segunda-feira!), e com um prazo de 15 dias para recebimento de sugestões, não é razoável e de fato não contempla as necessidades de análise e discussão para um contrato de tão grande impacto e duração.

Em suma, tememos que a concessão, por 15 anos, do estacionamento rotativo gere um engessamento do uso do sistema viário da cidade, podendo comprometer obras voltadas para melhorar e completar o sistema de mobilidade urbana, tais como alargamento de calçadas e implementação de ciclovias, faixas e corredores de ônibus.

Cidadeapé – Associação pela Mobilidade a Pé em São Paulo
Ciclocidade – Associação dos Ciclistas Urbanos de São Paulo

OPINIÃO – Quem são os reais invasores do espaço público?

Autores: Ana Carolina Nunes, Andrew Oliveira e Du Dias
Data: 20/06/2016

Quem anda na cidade tendo que desviar de inúmeros obstáculos e às vezes se lançar ao asfalto para poder seguir seu caminho sabe bem: os espaços públicos de convivência ou mobilidade de nossas cidades há muitos anos vêm sendo privatizados. Este uso privado do que é público não nos é danoso pelo fato de cada vez mais pessoas usarem determinado equipamento ou espaço, e sim porque há quem se sinta no direito de invadi-lo, apropriar-se do mesmo e distorcê-lo permanentemente em seu próprio e exclusivo benefício. A lógica perversa do Estado, no entanto, faz vista grossa em muitos destes casos, mas age com rigor desproporcional em outros.

As investidas das fiscalizações municipal ou estadual nos espaços públicos, muitas vezes de caráter midiático e higienista, recaem com frequência sobre o comércio ambulante informal e os moradores de rua. Mas poucos se atentam aos verdadeiros saqueadores urbanos.

Ninguém parece notar os muros e fachadas de edificações residenciais ou comerciais que avançam sobre o passeio, que deveria ser livre. Mesas e cadeiras de bares e restaurantes obstruem totalmente o fluxo de pessoas, mas são toleradas. E a maior transformação dos espaços de mobilidade de quem se locomove a pé, as calçadas, ocorreu silenciosamente nas últimas décadas: a privatização dos trechos em frente aos lotes de casas e comércios. Esses locais se tornaram acessos prioritários, quase exclusivos, de veículos motorizados aos lotes, onde seus proprietários se viram no direito de colocar degraus, rebaixar guias, colocar pisos inadequados — infringindo leis municipais que exigem um calçamento com uma inclinação transversal constante e superfície regular, firme, contínua e antiderrapante sob qualquer condição — apenas para ter um melhor acesso às suas garagens.

Essa desproporcionalidade é injusta e, além de tudo, não garante nada em termos de conforto e segurança às pessoas que se locomovem a pé na cidade, inclusive porque tolhe o direito à circulação e permanência aos cidadãos que vivem nas ruas. Por isso é importante ressaltar que pessoas em situação de rua têm tanto direito de usufruir do espaço público como qualquer outro indivíduo, com a única diferença de não possuírem CEP ou pagarem IPTU. E essa condição não os torna menos cidadãos nem justifica suprimir seus direitos. Porém, nossa sociedade tornou-se permissiva com as violações praticadas por aqueles que têm posses, poder aquisitivo e situação privilegiada, e repressiva quando se trata das necessidades ou direitos das camadas menos favorecidas social e economicamente. Qual será a origem da cumplicidade do poder público e seus órgãos fiscalizadores (e repressores) com os verdadeiros usurpadores do espaço? Por que há desproporcional rigidez (violência) com aqueles que SÓ têm o espaço público?

Se o ativismo em prol da mobilidade ativa e mesmo as administrações públicas adotam o discurso das “cidades para pessoas”, devemos sempre ter no horizonte os mais variados tipos de pessoas e usos possíveis da cidade. É muito perigoso cair na tentação de defender uma cidade com mobilidade exemplar, porém homogênea e asséptica. Essa não é a nossa realidade e não é nesse paradigma que vamos nos espelhar. Cada vez que falamos em cidades para pessoas, devemos responder à mesma pergunta: “Para quais pessoas?!” Se não for para todas, é porque estamos entrando novamente no caminho viciado da cidade excludente.

Cidades devem ser lugares abertos, democráticos, de permanência e encontro, diversidade e inclusão. O contrário disso não é uma cidade, é um clube privado ou um grande condomínio fechado.

Exemplo pouco percebido de apropriação do espaço público: a calçada, que é pública, se transformou para acomodar os desejos dos donos dos lotes quando instalaram suas garagens. Rua Barão do Bananal, na Pompeia, antes e depois das entradas de garagem.

Exemplo pouco percebido de apropriação do espaço público: a calçada, que é pública, se transformou para acomodar os desejos dos donos dos lotes quando instalaram suas garagens.
Rua Barão do Bananal, na Pompeia, antes e depois das entradas de garagem. Foto montagem: São Paulo em Foco

Imagem do post: Carro estacionado na calçada. Foto: Andrew Oliveira

“Por uma Av. Paulista Aberta: em diálogo com o MP”

Publicado originalmente em: ObservaSP
Autoras: *Letícia Lemos, **Luanda Vannuchi, ***Raquel Rolnik e ****Paula Santoro
Data: 22/10/2015

Comentário Cidadeapé:  Apoiamos a abertura da Paulista para as pessoas aos domingos. O texto abaixo, do ObservaSP,  toca nos pontos principais da argumentação do MPE contra essa iniciativa. Gostaríamos de estabelecer um diálogo direto com o MPE para tentar garantir uma boa solução para os usos do espaço viário. Ao mesmo tempo continuamos a conversar com a prefeitura no sentido de ajustar detalhes para melhorar a experiência para todos.

No último domingo, dia 18 de outubro, entre às 9h e às 17h, a avenida Paulista foi novamente aberta para pessoas como área de lazer, medida que deverá se repetir todos os domingos de agora em diante, segundo anúncio da prefeitura municipal. Festejada pela população, que lotou a avenida, apesar do frio, a medida foi contestada pela Promotoria de Justiça de Habitação e Urbanismo (PJHURB) do Ministério Público do Estado de São Paulo (MP) em duas notas à imprensa divulgadas nos dias 15 [1] e 16 de outubro [2]. Com argumentos conservadores e um claro posicionamento a priori contra a mudança no uso da via, a promotoria promete estudar as medidas cabíveis – incluindo ação civil pública e multa – caso o prefeito Fernando Haddad não reveja seu posicionamento.

Elencamos e discutimos abaixo os principais argumentos contidos nas notas:

O MP indica que a abertura da avenida para os pedestres está sendo “imposta à população sem que esta, sua destinatária final, tenha realmente oportunidade de externar sua opinião e anseios” e afirma que não há como saber “se a população é a favor ou contra a medida por inexistirem estudos ou pesquisas (por entidades independentes) nesse sentido”. Argumenta ainda que a audiência pública realizada no vão do MASP não tem valor estatístico.

Conforme amplamente noticiado pela mídia, foram realizadas pesquisas que indicaram aprovação tanto da população quanto do comércio local que abre aos domingos [3]. Mesmo entre aqueles que utilizam o carro diariamente ou quase diariamente, 54% se mostraram favoráveis a essa ação [4].

Para além das pesquisas, a medida está respaldada pela Política Nacional de Mobilidade Urbana: o Inciso I do Artigo 23 garante aos entes federativos utilizar como instrumento de gestão “restrição e controle de acesso e circulação, permanente ou temporário, de veículos motorizados em locais e horários predeterminados” [5].

Além disso, ao questionar a representatividade estatística da audiência pública realizada no vão do MASP no dia 19 de setembro, o MP põe em xeque a legitimidade de qualquer audiência pública já organizada na cidade, por não terem nunca reunido um número de pessoas capaz de distinguir a posição da maioria. A audiência pública enquanto instrumento democrático não pode, e nem tem como objetivo, equiparar-se em representatividade aos processos eleitorais ou plebiscitos.

O MP argumenta que a Paulista foi “concebida e construída para veículos” e que sua abertura para o lazer da população traz “inúmeras implicações e impactos”.

Primeiro é importante ressaltar que a cidade é produto da ação humana para o ser humano, ou seja, ela não é feita para veículos. A Av. Paulista foi concebida e construída para abrigar a aristocracia do café. Esta mesma avenida, quando aberta em 1898, abrigava a circulação de carruagens e bondes. Hoje, os palacetes, bondes e carruagens desapareceram para dar lugar a ônibus, carros, pedestres e ciclistas. Nenhuma rua ou avenida é estática: os modos de ocupar e circular se transformam e é próprio da política pública promover estas transformações. Além disso, é comum que alterações tenham impactos. No caso da abertura da Paulista para lazer, acredita-se que em geral serão impactos positivos. Para medi-los, a CET fez estudos e apresentou-os ao MP, prevendo medidas para mitigar eventuais transtornos.

A nota do MP faz menção aos estudos realizados pela CET, indicando que seriam baseados em “modelos teóricos ou, na melhor das hipóteses, em dados colhidos nas duas únicas oportunidades em que o fechamento se deu”.

Em primeiro lugar, os modelos teóricos são e devem ser usados para o planejamento. Caso contrário, a única base de análise seriam levantamentos empíricos e, na impossibilidade de realizá-los, nunca seria possível prever o impacto de nada e ficaríamos a mercê do status quo, eternamente. A questão é: quando um estudo é suficiente e perfeito em se tratando de um organismo vivo e dinâmico como a cidade? Não existe perfeição, muito menos decisão absolutamente tecnocrática, decorrente de estudos infalíveis. O que existem são alternativas, construídas frequentemente a partir de opções políticas que devem ir ao encontro do interesse público.

Um dos argumentos que serve como base para esses “modelos teóricos” está no fato de que as vias do entorno têm capacidade para receber o volume de veículos que circula na Av. Paulista. Segundo depoimentos de técnicos da CET, a Alameda Santos e a Rua São Carlos do Pinhal têm capacidade para receber os veículos que deixarão de circular pela Paulista aos domingos, por volta de 2 mil veículos por sentido, de acordo com contagens realizadas pelo órgão antes do primeiro fechamento da via. O principal conflito para o fechamento é a travessias dos ônibus pela Av. Brigadeiro Luiz Antônio, mas o cruzamento aí está sendo mantido.

Além disso, análises baseadas em dados empíricos também são fundamentais. Podem e devem subsidiar os estudos de impacto desse tipo de medida. Durante as duas experiências de abertura da Paulista, as medições realizadas pela CET demonstraram que a ação causou um baixo impacto no trânsito local. É comum que medidas de alteração de tráfego nas primeiras vezes que são realizadas impactem mais que nas demais, uma vez que alguns motoristas ainda desconhecem as alterações. O que reforça o argumento de que as duas medições são relevantes e suficientes para uma boa análise técnica.

Como já apontado, a cidade é dinâmica. Nada impede que novas medições sejam feitas no futuro, em processo de monitoramento que nos ajudará na tomada de decisões que vão na mesma direção de abrir outras avenidas para pessoas. Afinal, estamos construindo uma nova forma de utilizar os espaços públicos da cidade e não podemos refutá-la em função de um suposto desconhecimento preciso sobre sua implantação.

O MP apresentou à prefeitura “medidas alternativas” ao fechamento total para veículos em audiência realizada em setembro, sobre as quais a gestão deveria se posicionar até o dia 15 de outubro, o que não aconteceu.

Conforme reportado por veículos de comunicação no dia 08 de outubro (Estadão [6], UOL[7]), a alternativa que teria sido indicada pelo MP seria a manutenção de uma faixa de rolamento para veículos motorizados em cada sentido. Ora, não é de se espantar que a prefeitura não tenha acatado essa proposta, visto que a manutenção da circulação de automóveis, e ainda em ambos os sentidos, desconectando tanto as calçadas quanto as ciclovias das demais faixas destinadas ao lazer, implicaria em risco aos pedestres, ciclistas, crianças, praticantes de esporte etc.

Cabe ao MP indicar os problemas decorrentes da opção da Prefeitura, fazer recomendações, solicitar soluções (sem direcioná-las ou impô-las), e avaliar as medidas técnicas propostas pela gestão. Se o problema é o acesso aos imóveis pela Av. Paulista, a Prefeitura já afirmou que ele será garantido para os moradores ou trabalhadores da região. Em relação ao acesso aos hospitais, o Santa Catarina será o mais impactado, pois o acesso ao seu estacionamento se dá diretamente pela Paulista, mas também para esse caso a Prefeitura anunciou que está prevista uma faixa para acesso local.

Assim, escapa ao papel do MP a proposição de “medidas alternativas”. Formular política pública é papel da gestão pública. Criar soluções técnicas é papel dos órgãos competentes.

O MP argumenta que a atual gestão adota “posições radicais” ao defender o fechamento da avenida para carros – ao contrário do próprio MP, que buscaria “soluções alternativas que realmente democratizem a utilização dos espaços públicos”.

Em primeiro lugar, é exagerado considerar uma “posição radical” o fechamento de 4,5 km de via para carros, a fim de criar áreas de lazer na cidade de São Paulo, quando em várias outras cidades no Brasil e no mundo essa já é uma prática antiga. No Rio de Janeiro, as avenidas Atlântica e Vieira Souto, que beiram as praias de Copacabana e Ipanema, são fechadas para carros aos domingos já faz muito tempo. Na Cidade do México, 50 km de vias são dedicadas ao lazer aos domingos. Em Santiago do Chile, são 30 km. Além dessas cidades, Bogotá, Nova York, Paris e Londres também têm experiências semelhantes, que são consideradas um sucesso.

O problema nesse argumento vai mais além. Não cabe ao MP determinar se uma política pública é “radical”, principalmente dentro de um debate onde se criam oposições e no qual o próprio Ministério já demonstrou ter posicionamento definido.

Finalmente, a nota remete ao Termo de Ajustamento de Conduta firmado em 2007 com a Prefeitura de São Paulo. Esse termo limita a três por ano os fechamentos da Avenida Paulista para grandes eventos.

A abertura da Paulista aos domingos, para ser usada como local de lazer pela população, não é um evento, mas algo permanente, constante, já que se trata de uma política pública. Portanto, não se enquadra como “evento”, conforme descrito pelo próprio TAC, e logo este não pode servir para impedir que a abertura ocorra.

Portanto, não há sentido algum em recorrer ao TAC para esse debate. Se esta visão prevalecer e o MP resolver se ater ao TAC, significa então que restam duas opções que acirram antagonismos entre nós, cidadãos, dado que a Av. Paulista já abrigou o máximo de eventos permitidos em 2015: ou cancelamos a São Silvestre e a festa de Réveillon, se a circulação de automóveis, no dia 31 de dezembro, for prioridade absoluta para a cidade, ou então o MP poderia propor uma revisão desse TAC.

*

Por fim, mas não menos importante, o Ministério Público é uma instituição de relevância inegável na defesa dos direitos difusos, que tem uma atuação fundamental, inclusive para coibir abusos e ilegalidades praticados pelo Executivo e por outros agentes que atuam sobre a cidade. É fundamental que o MP continue tendo força nesse trabalho.

Mas no caso da abertura da Paulista, não podemos aceitar o posicionamento desta promotoria, que tem se mostrado conservador e pouco flexível em relação ao plano de uma administração municipal democraticamente eleita de reduzir a importância do transporte individual motorizado na cidade de São Paulo, abrindo ciclovias e áreas de lazer em espaços antes reservados exclusivamente aos carros. Com notas como essa, o MP corre o risco de diminuir sua credibilidade enquanto órgão tão fundamental, verdadeira conquista de nossa sociedade.

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Foto: Flávio Moraes.

Foto: Thiago Benicchio

* Leticia Lemos é arquiteta e urbanista, mestranda na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, e compõe a equipe do observaSP. Tem especialização em mobilidade não motorizada pela UNITAR.

**Luanda Vannuchi é geógrafa, mestre em estudos urbanos pela Vrije Universiteit Brussel e faz parte da equipe do observaSP.

***Raquel Rolnik é arquiteta e urbanista, professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP e uma das coordenadoras do observaSP.

****Paula Santoro é arquiteta e urbanista, professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP e uma das coordenadoras do observaSP. 

 

Imagem do post: Paulista Aberta. Foto: Letícia Lindenberg Lemos

Avenida Paulista para as pessoas: uma demanda da sociedade civil

Ao contrário do que o Ministério Público Estadual aponta, a proposta da Paulista Aberta aos domingos surgiu de uma demanda da sociedade civil e tem ampla aprovação.

Na última semana, o Ministério Público Estadual de São Paulo, por meio do promotor Mário Augusto Malaquias, da Promotoria de Justiça de Habitação e Urbanismo da Capital, abriu inquérito (429/2015) para investigar o bloqueio da Avenida Paulista a veículos automotores e a abertura da via aos domingos para as pessoas a pé, em bicicletas, em outros modos de locomoção ativos e usufruindo de atividades culturais.

O inquérito do MPE-SP se baseia em uma suposta violação do Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) para a realização de eventos de grande porte e de duração prolongada na Avenida Paulista do ano de 2007 (Inquérito Civil nº 283/03), firmado com a Prefeitura. O TAC estabelece que a Avenida Paulista poderá ser fechada para “eventos, manifestações, comemorações ou outras atividades de duração prolongada que impliquem a obstrução dessa via pública e que necessitem da autorização da PREFEITURA” apenas três vezes ao ano. O objetivo é garantir “direitos de locomoção, direito à cidade ordenada (garantindo a trafegabilidade, a acessibilidade, o conforto e o sossego, com o menor impacto possível no período de obstrução do sistema viário)”.

A Avenida Paulista tem um longo histórico de abertura para pessoas, seja em eventos, como palco de manifestações ou espaço de lazer. Quase semanalmente a avenida tem seu tráfego de veículos motorizados interrompido por movimentos políticos, sociais e culturais das mais diferentes matizes. No Natal, intensifica-se o fluxo a pé de pessoas que vão à avenida para ver a iluminação temática e fazer compras. Na gestão de Marta Suplicy o projeto Domingo na Paulista já transformava a via em área de lazer. Esta ação contou com 76% de aprovação da população e chegou a reunir 35 mil pessoas, mas foi interrompida no início da gestão Serra.

Ao longo do ano de 2014 a sociedade civil, por forma de ocupações e estratégias de pressão, retoma o pleito de usar a via como espaço de lazer aos domingos e pressionar a gestão municipal, nomeadamente o secretário de transportes Jilmar Tatto e o prefeito Fernando Haddad. Esta demanda, inspirada em outras cidades do Brasil e do mundo como Rio de Janeiro, Bogotá e Cidade do México, e a urgência de políticas para uma cidade mais humana com a promoção do usufruto dos espaços públicos, materializa-se com a abertura da Avenida Paulista nos dias 29 de junho e 23 de agosto de 2015, datas marcadas pelas inaugurações das ciclovias da Av. Paulista e da Av. Bernardino de Campos, respectivamente.

Estas experiências recentes são marcadas por grande sucesso. A CET relata baixo impacto no trânsito do entorno e ficou comprovada a alta aprovação por parte das pessoas que participam. Em pesquisa feita pela ONG Cidade Ativacom pedestres na avenida Paulista nos dias 28 de junho, 05, 15 e 18 de julho, 88% das pessoas se mostraram a favor da abertura da via para as pessoas aos domingos. Em mobilização articulada no site Panela de Pressão, 2.100 pessoas se manifestaram a favor da Paulista aberta aos domingos. Os hospitais da região, que poderiam ser contrários e constavam no TAC de 2007 como alguns dos impactados pela obstrução da via, afirmam que o fechamento da avenida para carros não afeta os atendimentos, conforme é destaque em grandes veículos de comunicação. Ainda assim, na última abertura da Avenida Paulista, em 23 de agosto, a CET fez uma operação especial para permitir o acesso de carros ao hospital Santa Catarina, ao club Homs e a hotéis. E outras adequações podem ser feitas, conforme demandas apontadas pelas empresas e moradores da região, visando a uma operação adequada a todos.

Diante desta massiva adesão e pensando a cidade como locus de democracia, é louvável que a Prefeitura volte a enxergar as vias públicas como espaço de convívio entre pessoas. Em especial a Paulista, por ser a avenida mais visitada da cidade, e uma das vias com maior fluxo a pé devido à sua extensa e diversa oferta cultural, comercial e de serviços de fácil acesso.

Consideramos que o Poder Judiciário tem um papel importante nos freios e contrapesos da democracia, principalmente no que diz respeito ao controle dos outros poderes em relação à Constituição e outras leis infraconstitucionais e à vontade popular. Contudo, ele não deve subjugar a vontade da população na formulação da agenda do Poder Executivo, como parece estar acontecendo. Pleiteamos a mesma visão da gestão municipal ao Ministério Público Estadual: que escute aos anseios da sociedade civil, ora manifestados por meio de organizações e coletivos que defendem a abertura da via para lazer aos domingos. É importante lembrar que a judicialização da questão da ciclovia da Avenida Paulista pelo MPE culminou com ênfase ao papel do Executivo pelo Tribunal de Justiça de São Paulo. Em acórdão, o desembargador relator do processo é claro ao afirmar que “o projeto de implantação do sistema cicloviário é um dos mais importantes da atual gestão municipal, eleita pelo povo paulistano para exercer as opções de políticas públicas nos assuntos locais, tal como é o trânsito, no exercício da competência do Município”.

Dito isso, solicitamos que o MPE-SP atualize a interpretação do TAC acima citado, levando em conta que seu texto está anacrônico em relação às novas visões de cidade e do uso do espaço público vigentes hoje na sociedade civil. Esclarecendo que em tal documento não consta a proibição do uso da via no caso de políticas públicas que possam trazer benefícios à população, como é o caso da abertura da Paulista para o usufruto dos cidadãos aos domingos.

Às entidades que ainda não estão convencidas sobre os benefícios da abertura da Avenida Paulista aos domingos ou não concordam com a mesma, propomos um diálogo franco e aberto, sem a necessidade de recorrer a processos judiciais, que tanto dificultam ouvir a voz da população.

Por fim, manifestamos aqui o nosso desejo de ver a abertura da Avenida Paulista aos domingos não como uma medida isolada, mas sim como uma ação, que abra caminho para um política pública de lazer e de humanização a ser estendida para toda a cidade de São Paulo. Sem cair em demagogias, é importante que essa expansão seja realizada em observância às demandas e peculiaridades de cada território.

Assinam embaixo:

SampaPé!/ Rede Minha Sampa/ Ciclocidade/ Greenpeace/ PaulistaAberta/ Pedal Verde/ Bike é Legal/ ITDP Brasil/ Acupuntura Urbana/ Instituto Aromeiazero/ Transporte Ativo/ Cidadeapé – Associação pela Mobilidade a Pé em São Paulo/ Catraca Livre/ Cidade Ativa/ Instituto Mobilidade Verde/ Laboratório da Cidade/ GT Mobilidade Urbana da Rede Nossa São Paulo/ Secretaria Executiva da Rede Nossa São Paulo/ Red OCARA – São Paulo/ Virada Sustentável/ Corridaamiga/ Pé de Igualdade

*Texto escrito por Ana Carolina Nunes, pesquisadora e mestranda do Programa de Pós-Graduação em Políticas Públicas da Universidade Federal do ABC, Letícia Leda Sabino, do movimento SampaPé e mestranda em Urban Design and City Planning da UCL em Londres e Rene Jose Rodrigues Fernandes, gerente de projetos do Centro de Empreendedorismo e Novos Negócios da Fundação Getulio Vargas e pesquisador em Administração Pública e Governo.

Imagem do post: 23/08/2015- São Paulo- SP, Brasil-  Prefeitura  de São Paulo faz avenida Paulista virar pista de lazer exclusiva para ciclistas e pedestrtes. Foto: André Tambucci/ Fotos Públicas

“Praças Impossíveis: Elas existem, mas ninguém consegue acessá-las”

Publicado originalmente em: Bike é Legal
Vídeorreportagem: Renata Falzoni
Data: 26/08/2015

Praças Impossíveis: Elas existem, mas ninguém consegue acessá-las. É o caso da Praça Campo de Bagatelle e do Obelisco no Ibirapuera. Em nota, prefeitura diz que vai estudar a necessidade de implantação de faixas de pedestres nas duas praças.

 

Imagem do post: Obelisco do Ibirapuera. Foto: TV Gazeta

“Abre-te Paulista: uma avenida aberta para pessoas”

Publicado originalmente em: Cidade Ativa
Data: 21/08/2015

As calorosas discussões sobre a implantação da ciclovia da Avenida Paulista, em São Paulo, foram só o começo para um debate que vai além da dicotomia “carros versus bicicletas”: o que está em pauta agora é o modelo de cidade que queremos construir. Na visão de muitos, a única saída é adotar, daqui em diante, a escala humana como “unidade de medida” para projetos urbanos.

Desde o final de 2014 um grupo de coletivos em São Paulo, encabeçado pela organizações Minha Sampa e SampaPé, está liderando a ação Paulista Aberta, cujo objetivo é “abrir” a Avenida Paulista para pedestres e ciclistas durante os domingos, restringindo o acesso de veículos.  A mudança de paradigma começa no vocabulário: a proposta é “abrir a avenida para pessoas”, e não “fechá-la para carros”, evitando a tentação de assumir que o espaço pertence, a princípio, aos automóveis.

O grupo teve a oportunidade de testar a estratégia durante o domingo ensolarado do dia 28 de junho. Em meio a centenas de ciclistas que estrearam a ciclovia em uma das mais emblemáticas avenidas do Brasil, os ativistas reinvidicavam por uma Paulista Aberta. Entre as diversas atividades coordenadas pelas organizações que apoiam a iniciativa, aconteceu a pesquisa conduzida pela equipe Cidade Ativa.

Utilizando painéis interativos, uma metodologia em desenvolvimento pelo grupo, usuários da avenida puderam opinar sobre a ciclovia da Avenida Paulista e a possível abertura da vida às pessoas. 99% dos visitantes neste dia disseram apoiar as duas iniciativas.

Dada a alta adesão à pesquisa no dia do evento e visando garantir uma maior (e mais variada) amostra, voluntários da ONG retornaram à Avenida Paulista nos dias 05 de julho, 15 de julho e 18 julho, buscando atrair outros perfis de pessoas com opiniões diversas. Ao contrário do que muitos imaginavam, a ciclovia teve ainda uma aprovação de 90% do total dos entrevistados e 88% disseram aprovar a abertura da Paulista aos domingos para pessoas. Chama a atenção que, mesmo quando 40% dos entrevistados aponta que não vai utilizar a ciclovia, 86% a aprova.

Além da abertura da Avenida Paulista, os entrevistados apoiam a abertura de outras vias aos domingos, com destaque para o Minhocão e o Centro Histórico. Com grande vocação para o lazer, esses locais caminham para a abertura às pessoas: o Minhocão já está aberto aos sábados à tarde, o Centro recebeu as iniciativas do projeto Centro Aberto, além de faixas de pedestre em diagonal. Essas medidas incentivam um caráter mais humano para esses locais, o que parece influenciar o desejo por mais espaço para pessoas.

Para saber mais sobre a pesquisa realizada pela Cidade Ativa, veja o relatório completo.

Relatório Paulista Aberta - Cidade Ativa 2015

Relatório Paulista Aberta – Cidade Ativa 2015

Imagem do post: Utilizando painéis interativos, uma metodologia em desenvolvimento pelo grupo, usuários da avenida puderam opinar sobre a ciclovia da Avenida Paulista e a possível abertura da vida às pessoas. 99% dos visitantes neste dia disseram apoiar as duas iniciativas. Foto. Cidade Ativa