Veja quais são os locais de maior risco para pedestres e ciclistas em São Paulo

Levantamento da Ciclocidade e da Cidadeapé traz mapa com vias mais perigosas

Por William Cardoso. Publicado originalmente em Folha de S.Paulo

Atravessar uma rua com a sinalização apagada, equilibrar-se em uma calçada estreita, pedalar por onde ainda não há uma ciclovia e sofrer a ameaça constante de atropelamento pela alta velocidade dos veículos. A vida de pedestres e ciclistas que se deslocam pela cidade de São Paulo é cheia de riscos, que foram mensurados em um levantamento da Ciclocidade e da Cidadeapé.

Baseada em dados da própria CET (Companhia de Engenharia de Tráfego), a pesquisa levou em consideração acidentes ocorridos de 2016 a 2020, que foram classificados de acordo com a gravidade para apontar os locais mais perigosos para ciclistas e pedestres. Os acidentes mais graves têm peso maior na conta e o resultado do cálculo é chamado de UPS (Unidade Padrão de Severidade) —quanto maior, mais perigoso.

Dessa maneira, chegou-se a 52 vias que têm UPS classificada como muito alta. Boa parte delas fica na periferia da capital, onde há mais deslocamentos a pé e as calçadas são mais estreitas. Mas a região central também tem lugares de extremo risco para pedestres e ciclistas.

Pedestres atravessam faixa na rua da Cantareira, em frente ao Mercado Municipal, um dos pontos destacados como mais críticos na capital paulista – Mathilde Missioneiro/Folhapress

Há 20 anos em uma banca quase na esquina entre as avenidas Ipiranga e São Luís, no centro, o jornaleiro já viu muitos acidentes, principalmente no período anterior à pandemia, quando a movimentação era maior na região. “Carro freando em cima de pedestre, ônibus que já atropelou gente no cruzamento”, conta. “O pessoal dá uma acelerada para aproveitar o sinal aberto. Muitas vezes, não dá certo, principalmente aqui nessa virada da esquina, porque tem ponto cego”, explica.

​O entregador Rodrigo Batagini Leon, 38, trabalha há um ano com aplicativo e afirma que, durante o período, ao menos seis colegas ciclistas se acidentaram na rua Augusta, uma das vias apontadas como de risco muito alto. “Em uma desatenção, você acerta o carro ou o carro te acerta”, diz. Apesar disso, ele conta que não pode abrir mão de passar pelo local. “Aqui, como a gente diz, é a galinha dos ovos de ouro, porque não para de tocar [os chamados no celular]. A renda é boa”, completa

Fonte : Ciclocidade / Cidadeapé

Responsável pelo levantamento, o pesquisador Flavio Soares afirma que a prefeitura lançou um plano de segurança viária que é “morno”, com metas genéricas e aquém da necessidade. “Se esse plano quer ser alguma coisa, a gente não pode discutir só duas rotas escolares seguras, por exemplo, mas cem. Ainda não caiu a ficha. É café com leite”, explica.

Soares diz que uma série de medidas poderiam colocar a segurança de quem anda a pé ou de bicicleta como prioridade. Instalar mais faixas de pedestres, priorizar o semáforo para quem caminha, aumentar as calçadas nas esquinas para que as travessias sejam encurtadas, implantar lombofaixas nas proximidades de cruzamentos com ciclovias são alguns dos pontos. “Dentro do orçamento que temos para asfaltamento, faríamos essa cidade ser maravilhosa em quatro anos”, afirma.

Com relação ao centro de São Paulo, especificamente, Soares diz que é preciso tirar o “veículo particular individual motorizado”. Ou seja, sem carros. “Politicamente, é difícil. Mas, honestamente, é o que deveria ser feito do ponto de vista de segurança viária”, afirma.

“É uma fábrica de acidentes o que a gente criou nessa cidade”, diz o diretor do departamento de mobilidade e logística do Instituto de Engenharia, Ivan Whately.

Para Whately, os problemas não estão somente no momento em que o pedestre, por exemplo, tenta atravessar as ruas. “Grande parte dos acidentes cadastrados ocorrem até mesmo dentro da própria calçada”, diz.

O engenheiro destaca que é preciso melhorar o desenho urbano, mas não só isso. Whately aponta a necessidade de estimular a educação no trânsito, bem como aumentar a fiscalização para coibir infrações.

Segundo ele, o aumento no número de motocicletas em circulação durante a pandemia, com muitas pessoas trabalhando com entregas, também merece atenção. “O pessoal guia perigosamente, não obedece sinalização”, diz.

Whately também diz que falta continuidade em projetos e cita, como exemplo, um iniciado na última década. “Chegou a ter, na área central, redução de 50% na quantidade de acidentes. Era um programa, mas que acabou virando só uma campanha. Quando muda prefeito, eles não gostam de seguir projeto que o antecessor estava tocando”, diz.

A Prefeitura de São Paulo, por meio da Secretaria de Mobilidade e Trânsito, afirmou que os dados e informações coletados a partir de estudos e mensurações realizados pela CET são utilizados permanentemente no planejamento e no desenvolvimento de ações voltadas à melhoria da segurança viária.

A administração municipal disse que, em 2019, lançou o “Plano de Segurança Viária – Vida Segura”, que parte da premissa de que nenhuma morte no trânsito é aceitável e que todos devem assumir sua responsabilidade para a redução dos acidentes.

A prefeitura afirmou que o Plano de Metas 2021-2024 também apresenta projetos de infraestrutura viária voltados à proteção de usuários vulneráveis, como, por exemplo, a implantação de novas 2.800 faixas de travessia para pedestres.

A administração municipal citou, entre os programas que beneficiam pedestres, a criação de áreas calmas (com velocidade máxima de 30 km/h), o Programa Pedestre Seguro (ampliação do tempo de travessia em corredores viários), Rotas Escolares Seguras (melhorias em locais com grande concentração de escolas), redução de velocidade de 50 km/h para 40 km/h em 24 vias, entre outras.

A prefeitura disse também que requalificou mais 1.651.813 m² de calçadas em toda a cidade, com investimento de R$ 140 milhões, por meio do PEC (Plano Emergencial de Calçadas), na gestão 2017/2020.

Para quem pedala, a prefeitura afirma que ampliou a malha cicloviária em 36%, chegando a 684 km de ciclovias e ciclofaixas, prevendo ainda novas estruturas.

Precisamos falar das calçadas

Do centro à periferia – como as calçadas da cidade refletem as desigualdades da cidade de São Paulo?

Muitas são as variáveis que podem demonstrar a forma como cuidamos do passeio público. A existência (ou não) do calçamento, sua largura livre e sem obstáculos, seu estado de manutenção, seu tipo de revestimento, são atributos essenciais das calçadas de uma cidade. Estamos falando do espaço que os cidadãos necessitam para ir, vir e permanecer com liberdade, autonomia e, principalmente, segurança, um direito que deveria ser assegurado e conservado. Apontado como um dos principais indicadores do grau de civilização de um lugar  por Eduardo Yázigi (2000), autor do livro O Mundo das Calçadas. Mas como a nossa calçada é tratada hoje em dia? 

Este foi o tema do Encontro com a Cidadeapé, realizado no dia 27 de setembro em atenção ao Mês da Mobilidade e mediado nossa diretora de relacionamento Wans Spiess. Nossos convidados:

Bruna Pizzol, engenheira civil pela EESC-USP, mestre e doutoranda pela Poli-USP. Pesquisadora vinculada ao LabGEO e ao Centro de Estudos da Metrópole, atua também como consultora de mobilidade urbana.

Fernando Gomes é Arquiteto e Urbanólogo, além de cientista de dados. Pós Graduando na Poli/USP no Departamento de Transportes , atualmente trabalha na Prefeitura de São Paulo, na Secretaria de Urbanismo e Licensiamento (SMUL) onde dirige a divisão de GeoProcessamento.

Márcio de Moraes é responsável pela Gestão de Voluntariado e Coordenação de Campanhas no Instituto Corrida Amiga.

Confira como foi a conversa no vídeo a seguir:

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Vistoria da ciclovia no Viaduto 9 de Julho

 Colaborou Giuliana Pompeu (Ciclocidade) – texto e fotos

Na última sexta-feira (12), um grupo de pessoas – entre técnicos da CET e representantes da Cidadeapé e Ciclocidade, se reuniu no começo do Viaduto Nove de Julho com a Rua da Consolação para fazer uma auditoria na ciclofaixa que foi pintada em uma das calçadas do viaduto.

Vista aérea e ao nível dos olhos da ciclovia no Viaduto 9 de Julho.

Local de grande fluxo de pedestres e ciclistas, o Viaduto Nove de Julho, no centro da capital, conecta a Avenida São Luís com a Rua Maria Paula e é um eixo importante de comércio e entregas. No último ano, com o aumento dos trabalhadores de entrega por aplicativo, o número de ciclistas cruzando o viaduto se intensificou e muitos acabam se arriscando na contramão da via para fazer a travessia com mais agilidade.

Como parte do plano de expansão da malha cicloviária e de conexão das infraestruturas já existentes, a prefeitura inaugurou o trecho de cerca de 270 metros da noite pro dia e tem recebido reclamações de pedestres e ciclistas. Duas percepções parecem ser unânimes: a importância da estrutura no local e a segurança dos pedestres e ciclistas que precisa ser prioridade.

Vista das faixas de rolamento da Rua Maria Paula.

Durante a vistoria, insistimos no uso de uma das faixas de rolamento para a construção de uma ciclovia adequada a velocidade da via, mas os técnicos da CET, apesar de considerarem, não se comprometeram e disseram ser um desafio “cultural” a prefeitura dar a devida prioridade a pedestres e ciclistas.

Os técnicos também foram questionados sobre a falta de diálogo com as organizações da sociedade civil e nos espaços institucionais, como o Conselho Municipal de Transporte e Trânsito e a Câmara Temática da Bicicleta, antes da implantação da estrutura, que agora eles também concordam que não é a ideal. O técnico Dawton Gaia chegou a dizer que isso foi cogitado, mas que eles não imaginavam que a novidade seria tão mal recebida.

Sobre a ciclofaixa no Viaduto Nove de Julho, ficou prometido que a Prefeitura fará a adequação da sinalização vertical e horizontal de estrutura compartilhada, para assim tentar coibir conflitos entre ciclistas e pedestres e reforçar o caráter partilhado do local. Os técnicos da CET disseram estar estudando a possibilidade de expandir uma ou as duas calçadas para fazer a ciclovia depois da faixa de serviço do calçadão. Ficamos com a expectativa que eles também considerem ocupar uma das faixas de rolamento.

Faixas de pedestres e ciclofaixa apagada

Faixa de pedestres apagada

Também durante a vistoria foi mostrado para os técnicos da CET a ausência de faixas de pedestres nos dois cruzamentos da Rua Santo Antônio com o viaduto e no acesso da mesma com a Rua Abolição, o que tem gerado maior risco nas travessias. Também na Rua Santo Antônio, dois trechos da ciclofaixa que haviam sido requalificados no começo do segundo semestre de 2020 foram cobertos por asfalto novo e estão apagados há mais de três meses. O técnico da CET, Dawton Gaia, disse estranhar a situação que não tinha conhecimento e prometeu que muito em breve as faixas serão refeitas, apesar de possíveis impasses sobre qual empresa ou órgão público seria de fato responsável pelo retrabalho.

Ciclovia no Viaduto Nove de Julho invade o passeio público

Por Mateo Murillo

Na última reunião da Câmara Temática de Mobilidade a Pé (CTMP), realizada em 22/01/2021, foi discutida a implantação de Ciclovia no Viaduto Nove de Julho sobre o passeio público existente.

Na foto abaixo, observa-se a marcação da obra de implantação de ciclovia partilhada com passeio no Viaduto Nove de Julho – entre o entroncamento da Rua Xavier de Toledo com a Av. da Consolação e a Rua Santo Antônio. 

Essa obra consta no mapa do Plano Cicloviário vigente (2020), marcada na imagem abaixo (traço amarelo com circulação em preto).

Imagem extraída do Plano Cicloviário da PMSP/ CET

 

A partir de questionamento enviado por Ana Carolina Carmona à Cidadeapé, colocamos à CET, responsável pelo projeto, as seguintes indagações:

  • O porquê da implantação prejudicando e estreitando o passeio público, sendo que no local temos seis faixas veiculares no mesmo sentido. Uma dessas faixas poderia abrigar uma ciclovia bidirecional.
  • A falta de transparência no encaminhamento do projeto – já em obras e que não passou por consultas públicas.
  • Como será a solução nos pontos mais estreitos do trecho em implantação e nos cruzamentos com a Rua Xavier de Toledo e Rua Santo Antônio, além da interferência com ponto de ônibus existente.
  • Como será garantida a segurança aos pedestres, dado a condição partilhada entre ciclovia e passeio (no mesmo pavimento e nível).

Durante a reunião da CMTP, a CET – representada por Luis Gregório – do Departamento de Modos Ativos – expôs que:

Além disso, foi ressaltado pela CET que a ciclovia partilhada com passeio público é uma solução excepcional, neste caso adotada devido às especificidades do local, em especial à rede de trólebus cujo remanejamento procurou-se evitar.

Foi informado também que foram realizadas contagens do fluxo de pedestres no Viaduto Nove de Julho – 447 pedestres/ hora pico manhã – e que esse montante admite um estreitamento da faixa livre de circulação na calçada Leste do viaduto.

Do projeto propriamente foi apresentado a seguinte imagem:

 

Foi informado também pela CET algumas larguras adotadas:

E os volumes veiculares:

Maria Teresa Fedeli, Assessoria Técnica da SMT e partícipe da Câmara Temática de Bicicletas (CTB), defendeu o projeto da CET, concordando com as argumentações colocadas por esta, apesar de ressaltar a preferência inicial pela diminuição do leito carroçável – mas que neste caso, optou-se pela solução partilhada.

É possível observar a necessidade de uma maior clareza no projeto, de modo que se possa avaliar a condição de caminhabilidade para o pedestre nos locais mais críticos e estreitos (nos cruzamentos com as ruas Xavier de Toledo e Santo Antônio, além da região junto a ponto de ônibus). 

Nos cruzamentos citados, além do fluxo de passagem deve ser calculada a área de acumulação necessária durante a espera nos semáforos.

Foi observado também à CET que não está claro o atendimento ao disposto no Manual Cicloviário Municipal de 2020, onde diz: “…a implantação de ciclofaixa sobre calçada ou canteiro divisor de pista partilhada com pedestre só deve ser permitida quando: a largura destinada à circulação exclusiva de pedestre atende ao fluxo verificado no local … com volume de pedestres inferior a 160 pedestres/hora/metro…”. Ou seja, considerando-se o valor informado de 447 pedestres/h, isto implicaria em um mínimo de 2,80m de largura para a faixa livre de circulação no Viaduto Nove de Julho.

Élio Camargo, pela Cidadeapé, observou que a linha eletrificada dos trólebus não é impedimento para a implantação da ciclovia no leito carroçável. Ela poderia ocupar a faixa junto ao canteiro central da via, sem interferir com a faixa do transporte coletivo, nem com o ponto de ônibus existente.

A discussão encerrou-se, ficando pendentes mais esclarecimentos futuros, inclusive com o compromisso da CET e da SMT de realizar vistoria in loco em conjunto com CTMP e CTB.

CONSIDERAÇÕES ADICIONAIS

A partir da imagem do projeto de sinalização exposto pela CET, verifica-se o seguinte:

No cruzamento com a Rua Xavier de Toledo há um estrangulamento da faixa livre de circulação. Falta clareza no projeto dado que, além do fluxo contabilizado de 447 pedestres por hora no viaduto, deve-se considerar o fluxo na Xavier de Toledo e os espaços para acumulação na espera semafórica.

Ampliação no cruzamento com a Xavier de Toledo – Fluxo de Pedestres em azul; ciclovias em amarelo

O mesmo se aplica ao cruzamento com a Rua Santo Antônio.

Ampliação no cruzamento com a Rua Santo Antônio – Fluxo de Pedestres em azul; ciclovias em amarelo.

Na parada de ônibus existente verifica-se claro conflito da ciclovia com o embarque e desembarque de passageiros, configurando-se situação de alto risco de acidentes. Além disso, esta solução inviabiliza a implantação de abrigo para o ponto de ônibus. 

Ampliação no ponto de ônibus

Causa estranheza a adoção de apenas 1,65m de largura para a ciclovia partilhada, sendo que o mínimo recomendado são 2,5m de largura. Isso implica em maior risco aos pedestres.

Alternativas que evitariam os conflitos acima colocados seriam:

  1. Ciclofaixa bidirecional ocupando a faixa junto ao canteiro central da pista Leste do viaduto. Seria uma solução de fácil implantação, sem interferências nos passeios existentes, nem no sistema de transporte coletivo. Perder-se-ia uma faixa carroçável; mas a ciclovia poderia ter condição operacional ótima – com 2,50m de largura e segregação de outros modais.

Em amarelo, estudo de ciclovia bidirecional

  1. Ciclofaixas unidirecionais, junto ao canteiro central do viaduto, implicando no estreitamento de faixas carroçáveis e do canteiro central – mantendo-se as seis faixas existentes. Porém, não há como avaliar a viabilidade dessa alternativa sem um levantamento topográfico preciso do local.

Em ambas as alternativas acima medidas adicionais seriam necessárias na separação/ proteção da faixa cicloviária que estiver em sentido oposto ao fluxo veicular (sinalização horizontal zebrada com ou sem tachões). Isso resulta mais simples e fácil na opção (1) acima, que ocupa uma faixa existente. Sugere-se à PMSP/ CET a avaliação de outras alternativas de projeto – como as acima colocadas – que garantam um melhor atendimento à preservação da caminhabilidade e às premissas do Manual Cicloviário Municipal de 2020.

O Estatuto do Pedestre finalmente foi regulamentado! E agora?

Depois de uma espera de 3 anos, finalmente a Prefeitura regulamentou o Estatuto do Pedestre. Comentamos alguns dos avanços e dúvidas trazidos pelo decreto

Caminhar pelas cidades é um direito elementar do ser humano. É também uma forma democrática e resiliente de se viver o meio urbano. Além de tudo isso, caminhar é um meio de transporte que, finalmente, ganha reconhecimento com a regulamentação do Estatuto do Pedestre por meio do Decreto nº 59.670 de 07 de agosto de 2020, véspera do dia internacional do pedestre.

O ato de caminhar não deve ser apressado e sim aproveitado. No entanto, ao passo que este simples ato comum a mais da metade da população de São Paulo faz parte do nosso cotidiano desde sempre, as políticas públicas ainda caminham pouco. O Estatuto do pedestre foi uma lei elaborada a partir da colaboração da sociedade civil, incluindo a Cidadeapé, com objetivo de formalizar instrumentos que possibilitem a garantia de direitos de quem caminha. No entanto, aguardamos há três anos pelo decreto do último dia 07.

Um primeiro passo foi dado e isso deve ser celebrado, sim! Muitos outros passos são possíveis e necessários para se corrigir e endireitar o caminho que ruma no sentido de políticas públicas que propiciem um caminhar pelas cidades seguro e confortável.

Segurança e conforto são valores subjetivos, e entendendo que cada um de nós tem sua percepção com relação a esses valores, todos devemos ser contemplados quando das definições dessas políticas que redefinem o espaço público urbano.

O que há de novo

Essa pode ser a primeira de algumas conquistas a serem valorizadas com o novo decreto, pois as travessias de pedestre agora poderão ter seu dimensionamento de tempo revisitado, contemplando idosos, crianças e pessoas com mobilidade reduzida. Isso porque o texto do decreto demarca que o Poder Público “deverá promover a revisão e a atualização dos parâmetros vigentes relativos à travessia de pedestres”. Atualmente, o fluxo de veículos é o principal fator determinante do tempo que temos para atravessar uma via.

Com a mudança, são apontadas outras condições que devem ser respeitadas, como a possibilidade de todos os pedestres completarem a travessia (em locais de grande fluxo), a largura da faixa proporcional a esse fluxo, um tempo de espera de no máximo 90 segundos (!!!) a observação do tempo que pessoas com mobilidade reduzida levam para se locomover. Quanto a isso, o texto, estabelece que devem ser consideradas as seguintes velocidades:

“a) crianças de até 7 (sete) anos e pessoas com deficiência: 0,6m (seis decímetros) por segundo;
b) idosos: 0,8m (oito decímetros) por segundo;
c) adultos e demais usuários: 1m (um metro) por segundo;

Por um lado, não está claro a partir de qual metodologia se chegou a esse cálculo – e talvez para chegar a ela seja necessário caminhar pelos inúmeros links e redirecionamentos que os instrumentos normativos brasileiros incorporam a sua estrutura. Ainda que não haja certeza se as velocidades indicadas são precisas, espera-se que a nova metodologia contemple os 25% da população paulistana que apresenta algum tipo de deficiência. Ou ainda os mais de 1 milhão de pessoas que estão acima dos 60 anos na capital do Estado de São Paulo. Será que o volume correspondente às crianças de até 07 anos também foi considerado na determinação destes tempos de travessia? 

No momento, resta avaliar se na prática esses novos tempos semafóricos estarão adequados. Na teoria, pode-se questionar a probabilidade de um idoso caminhar a 0,80 metros por segundo. Até mesmo adultos caminhando a 1 metro por segundo é bastante duvidoso. Talvez estes parâmetros sejam revisitados daqui um tempo, senão será melhor correr ou esperar que você possa andar sozinho pela cidade. Questionável também o quanto às travessias estarão aderentes ao princípio dos dois sentidos que devemos prever para um deslocamento seguro aos paulistanos e paulistanas com deficiência, pois o decreto não aborda as especificidades das travessias para deficientes visuais ou auditivos…

Mas lembramos que estamos celebrando uma conquista, certo? Outro reconhecimento da importância mobilidade a pé trazido por este decreto é a sinalização informacional e direcional destinada à pedestres. Essas são as informações que nos permitem nos localizar na cidade e planejar nossos caminhos quando estão a pé. Atualmente, a maioria esmagadora das informações sobre direções na cidade são disponibilizadas apenas em placas voltadas para motoristas.Com sinalizações direcionadas aos pedestres, facilita-se o diálogo entre ser humano e ambiente, permite-se uma dinâmica de interação mais viva do espaço urbano e explicita um cuidado com a construção da cidade na escala humana, valorizando e organizando os fluxos de pedestres no tecido urbano.

Faz parte deste movimento pró-mobilidade a pé também a conquista da implantação de uma plataforma virtual onde se concentrem todas as informações mais relevantes sobre o tema – desde dados de contagem de pedestres, estudos sobre a rede de mobilidade a pé, orçamento previstos para melhorias de infraestrutura de mobilidade a pé, além de acompanhamento de obras. O sistema de informações prevê também incluir informações sobre “acidentes”, que pode incluir atropelamentos e também quedas em calçadas, que hoje não são computadas como ocorrências de trânsito.

Apesar de não se detalhar como ou quando será estruturado esse espaço virtual, dando apenas indícios que fará parte do portal SP156, é uma importante evolução que  permitirá aproximar a sociedade civil das informações relacionadas à mobilidade a pé. Pode também ser um bom instrumento de cobrança pela população e organizações/associações envolvidas na temática de mobilidade a pé sobre os órgãos tomadores de decisão, para que estes promovam políticas públicas mais aderentes às necessidades evidenciadas pelas informações registradas. É um instrumento de empoderamento da sociedade sobre a temática de mobilidade a pé, explicitando seus direitos e deveres enquanto cidadãos.

Espera-se que seja evidenciado desde seu nascedouro a necessidade de contemplar acessibilidade digital para uso democrático deste instrumento. Este novo ambiente digital é, sobretudo, um ambiente rico em informações para os próprios gestores públicos se organizarem, anteciparem necessidades de aprimoramento da infraestrutura de mobilidade a pé  e priorizarem intervenções urbanas mais conectadas com  as demandas da sociedade.

Vale lembrar ainda que as calçadas são compartilhadas muitas vezes com outros serviços elementares aos cidadãos das cidades e este decreto trouxe à tona uma importante questão sobre a necessidade de cuidados com esse compartilhamento de espaço. Com essa nova regulamentação, reforça-se as obrigações de as concessionárias prestadoras de serviço de iluminação pública e de telecomunicações zelarem pela implantação correta de seus elementos como postes, fios, bueiros e caixas de inspeção, de tal modo que não interfiram na qualidade de uso desta via pelos pedestres que ali passarão. Quando de elementos já instalados que estejam em desalinhamento com as prerrogativas de acessibilidade e dos novos conceitos de circulação do manual de desenho urbano, as concessionárias serão notificadas e deverão realizar as adequações, estando sujeitas a multas de valores previstos no decreto (R$500,00 por fachada de quadra).

“Toda grande caminhada começa com um primeiro passo”. Mais um passo foi dado, agora nos compete continuar caminhando e cobrando, juntos e atentos, para que o nosso espaço urbano seja cada vez mais seguro, confortável e caminhável. Acompanharemos de perto para que a implementação das disposições estipuladas pelo Estatuto de Pedestre não demore tanto quanto a regulamentação da lei. “Caminhante não há caminho, caminho se faz ao caminhar” e assim a Cidadeapé estará junto dos pedestres paulistanos para construir esse caminho.

Para saber mais:
Confira aqui o decreto de regulamentação (nº59.670/2020) do Estatuto do Pedestre (lei nº 16.673/2017).
Ouça a entrevista que a associada Ana Carolina Nunes deu ao podcast do Estadão, comentando sobre as novidades do estatuto.
Veja o vídeo que Letícia Sabino, da ONG SampaPé, fez comentando a regulamentação.

Fiscalizando o andamento do Programa Emergencial de Calçadas

Desde o ano passado, a prefeitura retomou o Programa Emergencial de Calçadas, que visa construir e requalificar calçadas de áreas com grande fluxo de pessoas. Após um hiato de anos sem executar obras de requalificação de calçadas, elas foram retomadas. A Cidadeapé, por meio do seu GT Calçadas, tem feito um esforço para acompanhar como está sendo realizada a sua execução.

EXECUÇÃO DO ORÇAMENTO

Segundo informação dada por representante da Prefeitura na reunião de julho da CTMP- Câmara Temática de Mobilidade a Pé do CMTT, dos R$ 400 milhões previstos pela atual gestão para o programa, apenas R$ 131 milhões foram efetivamente aplicados até agora. Devido à pandemia, R$ 200 milhões, vindos do Tesouro, foram contingenciados e podem ter outra destinação. Para efeitos de comparação, em 2018 o orçamento anunciado para o programa eleitoreiro “Asfalto Novo” foi de R$ 550 milhões. Enquanto isso, o valor executado em obras para a mobilidade a pé foi quase nulo.

Cumpre notar, que o PEC, regulamentada pela lei 14.675/2008, deveria ter seus recursos aplicados durante a integralidade das diferentes gestões. Não é o que tem acontecido, desde a aprovação da lei em 2008. As obras nas calçadas, só acontecem no último ano da  atual gestão.Sobre isso, nosso associado Gilberto de Carvalho escreveu: “Se as calçadas são uma espécie de “patinho feio” da zeladoria urbana, isto não acontece por acaso. Além da verba ser pequena em relação aos gastos com o asfalto, por exemplo, nem mesmo se consegue atingir o teto de gastos previsto para a execução de sua conservação. A situação se agrava, pensando que metrópoles do mundo inteiro colocaram a pauta da mobilidade ativa em primeiro plano, logo após o início da pandemia. A cidade de São Paulo, não teve uma única iniciativa que fosse, focada diretamente no pedestre e na mobilidade ativa. Cumpre corrigir esta falta de ações pela mobilidade ativa urgentemente. Com o início da nova etapa do desconfinamento, os parque estarão abertos e uma enorme quantidade de pessoas, que esteve confinada por mais de 100 dias, precisa encontrar uma cidade mais segura e mais focada nas pessoas.”

VERIFICAÇÃO DAS CALÇADAS JÁ REFORMADAS

Para permitir um acompanhamento cidadão, a Cidadeapé entrou com um pedido via Lei de Acesso à Informação (LAI) pedindo informações sobre o andamento das obras do PEC. Recebemos um documento com os endereços dos locais onde as calçadas já foram entregues. Esse documento pode ser encontrado aqui.

Estamos organizando, junto à Corrida Amiga, um monitoramento colaborativo da entrega das calçadas reformadas, como integrante da campanha “Calçada Cilada” desse ano. Enquanto isso, é possível colaborar através de um formulário online:

“Este ano, pela impossibilidade de estarmos nas ruas para registrar as ciladas, utilizaremos uma consulta pública digital em parceria com o Colab. Convidamos você a participar através do link: consultas.colab.re/calcadacilada2020

Sua participação é muito importante, pois respondendo a consulta você nos ajudará apontar as localidades onde melhorias nas calçadas são necessárias e a desenhar um panorama dos principais problemas encontrados no deslocamento a pé.” – Marcio,  da Corrida Amiga

Patinetes elétricos e a mobilidade ativa

Cidadapé se posiciona a respeito dos patinetes como novo modo de transporte  e sua relação com a cidade e os outros modos de deslocamento, sobretudo no que diz respeito aos espaços e prioridades na infraestrutura urbana. 

O uso das calçadas como infraestrutura para a circulação e estacionamento de patinetes elétricos, classificados pela legislação pertinente como equipamentos de mobilidade individual autopropelidos, tem tomado cada vez mais espaço nos debates. Mas é importante lembrar que não se trata apenas de patinetes, trata-se de mais um modo de transporte para a cidades. Para ser eficiente, a mobilidade urbana deve garantir diversidade de opções para realizar os deslocamentos, mas precisa ser sobretudo segura e sustentável. Por isso modos de transporte que ocupam menos espaço e usam energia mais limpa têm prioridade no sistema (cf. PNMU e PlanMob). É necessário melhorar a mobilidade na cidade, preservando a prioridade e a segurança dos mais frágeis. Por isso modos ativos e/ou limpos, como patinetes, são bem-vindos como alternativas de transporte, desde que incorporados ao sistema com segurança e respeito.

O tema dos patinetes ganhou ainda mais repercussão depois de um militar ser atropelado por um carro sobre uma faixa de pedestres enquanto andava de patinete elétrico em 07/05/19 – demonstrando que a fragilidade dos usuários desse veículo se assemelha à de pedestres na cidade. Em resposta, a Prefeitura de São Paulo lançou às pressas um decreto provisório que, entre outras coisas, obriga o uso de capacetes e institui multas para a circulação desses veículos em calçada.

A Cidadeapé se posiciona contra esse decreto que parece ter uma função mais midiática — de mostrar uma aparente capacidade de resposta da Prefeitura a esse suposto problema –, do que efetivamente reduzir conflitos e promover a segurança viária. Os conflitos entre modos de transporte ativos e motorizados são uma das mais importantes questões da mobilidade urbana sendo discutidas com a prefeitura com pouco progresso nos últimos anos, como se observa pelos elevados números de vítimas no trânsito paulistano. É uma discussão que precisa ser feita com seriedade, método e compromisso, e não de forma reativa e imediatista.

A discussão sobre os patinetes em particular teve início em reunião no dia 28 de março, junto às Câmaras Temáticas da Bicicleta e da Mobilidade a Pé (CTB e CTMP). O objetivo era incorporar à regulamentação as reais necessidades dos novos tipos de transporte ativo no contexto da mobilidade paulistana, que ainda não tem infraestrutura apropriada para os modos mais frágeis de deslocamento, em particular a pé e de bicicleta.

Lamentamos que a gestão tenha atropelado o debate, especialmente quando havíamos sido informadas de que haveria discussões públicas antes da publicação do decreto do executivo. De qualquer maneira, estaremos presentes na audiência pública sobre o projeto de lei 01/2019, do legislativo municipal, que propõe regulamentação sobre o Sistema de Micromobilidade Compartilhada, no dia 21/05/2019 a partir das 19h00. Convidamos todos e todas a também participarem!

As raízes dos conflitos

Frente a esse tema, a Cidadeapé ressalta alguns aspectos que deveriam ser levados em consideração quando da regulamentação municipal da operação de novos serviços de transporte: infraestrutura disponível, prioridades de uso das vias (calçadas e ruas) e principalmente a segurança de todos os usuários.

Um dos aspectos se relaciona com a garantia de infraestrutura de qualidade e dos direitos de quem anda a pé.

Segundo padrão definido pela prefeitura de São Paulo para calçadas, elas devem ter uma faixa de circulação e uma de serviços. A de serviços, onde deverá estar posicionado o mobiliário urbano, como rampas de acesso, postes de iluminação, sinalização de trânsito, tampas de bueiro, entre outros, deve ter largura mínima de 70 cm. Já a faixa livre para circulação, com largura mínima de 1,20 m, precisa ser contínua, regular e estar totalmente desobstruída.

Cartilha Passeio Livre: Conheça as regras para arrumar a sua calçada (PMSP)

A faixa livre é o espaço destinado à circulação de pedestres de todos gêneros e idades, inclusive pessoas com todo tipo de deficiência. Na divisão do espaço urbano, estas estruturas que deveriam dar segurança, conforto e eficiência em quase 70% das viagens realizadas diariamente na cidade de São Paulo raramente possuem as qualidades mínimas ou dimensões suficientes para acomodar esse contingente de usuários. Em muitas vias sequer há calçadas. O espaço destinado ao trânsito e estacionamento de veículos motorizados individuais, por outro lado, é bem mais generoso: muito embora sejam responsáveis por apenas 31,2% das viagens diárias da cidade, ocupam ao menos 80% do espaços das ruas (Dados: Metrô: OD 2017).

Ou seja, mesmo que os padrões definidos pela prefeitura estejam de acordo com a Política Nacional de Mobilidade Urbana (PNMU) e o Plano Municipal de Mobilidade (PlanMob), estas definições ainda não saíram do papel. Sem condições de caminhar por calçadas esburacadas, com rampas de acesso a garagens formando degraus, postes e lixeiras atravancando a passagem, não é incomum que pedestres se vejam obrigados a caminhar por onde circulam os automóveis. Esta é uma evidência da demanda urgente por melhores estruturas para caminhar e da necessidade de equalizar suas dimensões, a fim de comportar não só os pedestres mas também a outros tipos de modos de transporte ativos sempre que possível. Sem intervenções significativas nas calçadas, no entanto, é difícil acreditar que as estruturas atuais sejam capazes de atender a uma nova demanda.

Por meio da Resolução 465/13, o Contran estabelece que veículos com as características funcionais e tecnológicas utilizadas pelos patinetes elétricos devem empregar a velocidade máxima de 6 km/h quando circularem em calçadas. No entanto, essa velocidade é superior à velocidade média de quem anda a pé, que pode variar entre 5 km/h e 3,5 km/h, sendo esta a velocidade média de pessoas idosas, com deficiência (PCD) ou restrição de mobilidade. Além disso, os patinetes têm aceleração rápida e um sistema de cobrança por minuto, o que induz seus usuários a desenvolverem as velocidades máximas sempre que possível, podendo atingir 30 km/h. A impossibilidade de fiscalização das velocidades praticadas nas calçadas é mais um agravante, que faz com que na prática os pedestres fiquem sujeitos a dividir o já deficiente espaço das calçadas com pessoas em patinetes circulando a velocidades totalmente incompatíveis.

Por outro lado, é preciso entender por que usuário(a)s de patinete optam por circularem em calçadas em vez de utilizarem a pista junto com os veículos motorizados. Levando em consideração fatores de segurança viária, circular de patinete junto com os carros e motos pode ser muito perigoso e inclusive oferecer risco à vida de seus usuários, como ocorrido no caso do militar atropelado.

Uma discussão abrangente sobre a circulação de patinetes elétricos em calçadas deve levar em consideração ao menos essas questões, a fim de que as soluções possam ser fruto não apenas de critérios técnicos (ou, como neste caso, de reações apressadas), mas também de reflexões que recuperem o histórico de planejamento e de investimento em infraestrutura de mobilidade. Isso porque o acirramento de conflitos relativos à prioridade de uso das calçada não é uma decorrência apenas do surgimento de novas tecnologias em transporte, é principalmente fruto do exíguo espaço destinado às pessoas que se deslocam a pé pela cidade.

A proposta atual não contribui para dar condições realmente efetivas de acomodar o potencial de novos modos de transporte, como os patinetes, e muito menos para preservar a segurança dos pedestres – que continuam sendo o elo mais vulnerável na mobilidade. Assim, mais uma vez, a discussão não deve se restringir somente às características dos equipamentos e limitações de uso, com as responsabilidades pesando apenas sobre as empresas prestadoras de serviços e as pessoas procurando boas alternativas de deslocamento. É essencial  tocar em pontos realmente capazes de acomodar com conforto, eficiência e segurança todos que se deslocam pela cidade, independente do modo, e sobre as responsabilidades do poder público de facilitar a mobilidade urbana e promover a segurança nas vias. Precisamos equalizar os tempos e espaços urbanos, ou seja, diminuir o espaço viário destinado a automóveis, motocicletas e caminhões e as suas velocidades, e restabelecer a prioridade dos modos ativos, qualificando a estrutura para estes.

O que uma regulamentação deveria contemplar?

Em resumo, sugerimos que a regulamentação sobre serviços de compartilhamento de transportes como patinetes deveria contemplar os seguintes aspectos a fim de respeitar a prioridade absoluta a quem se desloca a pé e a segurança de todos:

  1. Acalmamento do trânsito. As áreas onde há maior demanda de viagens por bicicletas e patinetes compartilhados devem ser alvo de ações (de sinalização, geometria e fiscalização) que visem a acalmar o tráfego e reduzir as velocidades desenvolvidas pelos automóveis, a fim de garantir a segurança viária, e de modo que ciclistas e usuários de patinetes possam de fato trafegar pelas vias sem temer por suas vidas.
  2. Uma forma de cobrança que não estimule a velocidade. Ou seja, a regulamentação deveria vedar a cobrança de serviços por minuto, entendendo que isso estimula os usuários a desenvolver velocidades máximas acima do recomendado. A cobrança por distância percorrida pode ser uma opção.
  3. Ocupar espaços de estacionamento nas vias com pontos de apoio. Para evitar o estacionamento de ciclos  (patinetes e bicicletas compartilhadas) em calçadas, que muitas vezes obstruem passagem de pedestres, a Prefeitura deve facilitar a transformação de espaços no leito viário que hoje são ocupados por carros estacionados em pontos de estacionamento para mais tipos de veículos, como bicicletas e patinetes compartilhados, a exemplo do que está fazendo Lisboa. Numa vaga em que cabe apenas um carro, cabem diversas bicicletas e patinetes, ampliando de fato as vagas de estacionamento por veículo ao mesmo tempo em que desestimula o uso de carros.
  4. Restrições para o estacionamento em calçadas. Além de usar os espaços de estacionamento do leito viário, os veículos poderiam estacionar apenas em áreas particulares e na faixa de serviço de calçadas que atendam à largura mínima determinada por lei.
  5. Política de abertura dos dados. Os dados sobre viagens de sistemas de transporte compartilhados são extremamente importantes para os desenvolvimento de políticas de mobilidade urbana. As informações sobre percursos realizados devem ser, portanto, publicizadas pelas empresas responsáveis por esse serviço, de forma a proteger os dados pessoais de seus usuários.
  6. Regulação das áreas de operação. A Prefeitura deve ter a prerrogativa de restringir a operação de serviços de compartilhamento em áreas onde já há saturação de veículos e elevada ocupação das calçadas. E por outro lado estimular a ampliação da cobertura de serviços para áreas com poucas opções de transporte público e coletivo.

Mais sobre o assunto

Imagem do post: Foto: Reuters/BBC

“Ativistas avaliam novo padrão de calçadas em SP”

Publicado originalmente em: Mobilize Brazil
Data: 17/10/2018
Autora: Regina Rocha

O novo padrão de calçadas que a Prefeitura de São Paulo pretende adotar na cidade, e que foi implantado em caráter piloto em uma área da zona sul da capital – na rua Pedro de Toledo, Vila Mariana -, foi vistoriado por um grupo da Comissão Técnica de Mobilidade a Pé e Acessibilidade da ANTP.

Para a caminhada, o grupo partiu da Pedro de Toledo, esquina com a Napoleão de Barros, e seguiu até a recém-inaugurada estação Hospital São Paulo da linha 5-lilás do metrô. Participaram da ação idosos, pessoas com deficiência visual e pessoas com deficiência física que, ao longo do trajeto, fizeram anotações, avaliações e registros em foto e vídeo de suas experiências.

O novo passeio, definido pela Comissão Permanente de Calçadas do município, apresenta na faixa livre um piso cimentado, bastante liso e regular; e nas bordas – nas faixas de serviço e de acesso – revestimento vermelho com blocos intertravados de concreto.

A execução ficou a cargo da Secretaria de Serviços e Obras, e foi iniciada em dezembro, tendo durado cerca de três meses. O custo orçado foi de quase R$ 1,4 milhão

Impressões in loco

Na vistoria feita pelo grupo da ANTP, a nova calçada mostrou-se tecnicamente bem executada, mas com importantes ressalvas – que no mínimo justificam uma revisão conceitual do padrão adotado – quanto à segurança de quem por lá caminhar. Em primeiro lugar, o grupo observou que, embora o piso seja bem construído, totalmente liso e plano, sem quaisquer ranhuras, textura perceptível ou porosidade, justamente essas características podem provocar, em dias úmidos, derrapagens e portanto uma chance maior de quedas das pessoas. Segundo o relatório do grupo: “No clima úmido ou chuvoso, tanto pela presença de folhas caídas das árvores existentes ao longo da via como pela formação de lâmina de água, o piso facilita a derrapagem e muitos usuários escorregam e sofrem quedas. (…) Esta solução exige que haja limpeza e drenagem constantes e suficientes para manter a superfície apropriada a evitar quedas e escorregões”.

Outro ponto negativo foi a ausência do piso tátil direcional, notada principalmente pelas pessoas cegas do grupo, que se sentiram desorientadas ao longo de todo o percurso. Ao que parece, os blocos intertravados instalados nas faixas de serviço e de acesso foram usados para servir de piso tátil direcional, solução que não se mostrou suficiente nem adequada a tal função. Como aponta o relatório: “…o piso direcional não pode absolutamente ser substituído por soluções com saliência fora do padrão NBR 9050, ainda mais situadas fora da faixa útil da calçada”.

Outro problema que chamou a atenção do grupo, esse de execução, foi a incorreta instalação das tampas de caixas de serviço das concessionárias, que ficaram desniveladas, tornando-se obstáculos perigosos, capazes de provocar tropeções e quedas.

Já no trecho do entorno da estação Hospital São Paulo, o grupo observou que a calçada, de responsabilidade do Metrô, adota outro padrão construtivo, à base de blocos intertravados, um piso diferente que cria descontinuidade na caminhada. Esta despadronização, denuncia o relatório, “compromete o instituído pela NBR 9050 para dar total segurança à pessoa com restrição de mobilidade”.

Confira aqui o relatório completo elaborado pela Comissão Técnica de Mobilidade a Pé e Acessibilidade da ANTP

Imagem do post: Pedestres e cadeirantes testam nova calçada paulistana. Foto: Meli Malatesta

Pedimos R$ 110 milhões para fiscalização que beneficiam pedestres

A Cidadeapé participou da Audiência Pública “Serviço de fiscalização automática de trânsito com equipamento/sistema eletrônico no município de São Paulo” (Processo administrativo municipal 6020.2018/0003543-3), realizada em 04/10/2018, R. Barão de Itapetininga, 18, República, São Paulo – SP

Considerando a Política Nacional de Mobilidade Urbana, Código de Trânsito Brasileiro, o Estatuto do Pedestre e os dados da Pesquisa Origem e Destino da Região Metropolitana de São Paulo, solicitamos que um terço do valor da licitação a ser aberta, sobre fiscalização automática de trânsito, seja destinada à mobilidade a pé.

Protocolamos o documento e vamos aguardar nova consulta pública para que possamos incidir no texto final do chamado da licitação. Confira na íntegra:

Considerando,
1) no âmbito federal, a Política Nacional de Mobilidade Urbana (LEI Nº 12.587, DE 3 DE JANEIRO DE 2012), em seu Art. 5º fundamentada em princípios dos quais destacamos:

I – acessibilidade universal;
VI – segurança nos deslocamentos das pessoas;
VII – justa distribuição dos benefícios e ônus decorrentes do uso dos diferentes modos e serviços;
VIII – equidade no uso do espaço público de circulação, vias e logradouros;

E em seu Art 6º é orientada por diretrizes das quais destacamos:

II – prioridade dos modos de transportes não motorizados sobre os motorizados e dos serviços de transporte público coletivo sobre o transporte individual motorizado;
IV – mitigação dos custos ambientais, sociais e econômicos dos deslocamentos de pessoas e cargas na cidade;
V – incentivo ao desenvolvimento científico-tecnológico e ao uso de energias renováveis e menos poluentes;

2) Código de Trânsito Brasileiro, do qual destacamos do Art. 1º :

§ 2º O trânsito, em condições seguras, é um direito de todos e dever dos órgãos e entidades componentes do Sistema Nacional de Trânsito, a estes cabendo, no âmbito das respectivas competências, adotar as medidas destinadas a assegurar esse direito.
§ 3º Os órgãos e entidades componentes do Sistema Nacional de Trânsito respondem, no âmbito das respectivas competências, objetivamente, por danos causados aos cidadãos em virtude de ação, omissão ou erro na execução e manutenção de programas, projetos e serviços que garantam o exercício do direito do trânsito seguro.
§ 5º Os órgãos e entidades de trânsito pertencentes ao Sistema Nacional de Trânsito darão prioridade em suas ações à defesa da vida, nela incluída a preservação da saúde e do meio-ambiente.

E o Art. 326, que teve sua redação atualizada pela Plano Nacional de Redução de Mortes e Lesões no Trânsito (Pnatrans,LEI Nº 13.614, DE 11 DE JANEIRO DE 2018. )

Art 326 – A A atuação dos integrantes do Sistema Nacional de Trânsito, no que se refere à política de segurança no trânsito, deverá voltar-se prioritariamente para o cumprimento de metas anuais de redução de índice de mortos por grupo de veículos e de índice de mortos por grupo de habitantes, ambos apurados por Estado e por ano, detalhando-se os dados levantados e as ações realizadas por vias federais, estaduais e municipais.

3) no âmbito municipal, o Estatuto do Pedestre (lei 16.673, de 13 de junho de 2017), do qual destacamos os objetivos no Art 8º:
II – a criação de uma cultura favorável à mobilidade a pé, como modalidade de deslocamento eficiente e saudável;
III – melhoria das condições de mobilidade a pé da população, com conforto, segurança e modicidade, incluindo os grupos de mobilidade reduzida;
VI – redução de quedas e atropelamentos relacionados à circulação de pedestres junto aos componentes do sistema;
X – o desestímulo ao uso de veículos automotores em circulação e dos índices de emissão de poluentes no ar;

4) a Pesquisa Origem e Destino da Região Metropolitana de São Paulo, realizada pelo Metrô (série histórica 1977, 1987, 1997, 2007 e 2012), que comprova que ⅓ das viagens são realizadas exclusivamente a pé, de acordo com a metodologia adotada.

Perante ao exposto, consideramos justo e equânime solicitar ⅓ (um terço) do valor total do serviço licitado, ou seja R$ 110.000.000 – cento e dez milhões de reais, e seus aditivos, sejam aplicados em tecnologia de fiscalização automática que vise a melhoria das condições da mobilidade a pé, especificamente:

Fiscalização automática de estacionamento sobre calçadas (Enquadramento CONTRAN 54521)
Fiscalização automática de estacionamento sobre faixa de pedestre (54522)
Fiscalização automática de estacionamento sobre ciclovia ou ciclofaixa (54523)
Fiscalização automática de transitar com veículos em calçadas e passeios (58191)
Fiscalização automática de transitar com veículos em ciclovias ou ciclofaixas (58192)
Fiscalização automática de avanço de sinal vermelho para veículos (60501)
Fiscalização automática de não aguardar o pedestre a concluir a travessia (61301)
Fiscalização automática de desrespeito ao pedestre na conversão(61651)
Fiscalização automática de estacionamento em pontos de embarque e desembarque do transporte coletivo (55090)
Fiscalização automática de estacionamento indevido em vaga de pessoa com deficiência (55415)
Fiscalização automática de transitar pela contramão de direção em via com sinalização de regulamentação sentido único (57380)
Fiscalização automática de transitar pela contramão de direção em via com duplo sentido de circulação (57200)

Adicionamos ainda:
Fiscalização de velocidade por velocidade média, por trechos, com intuito de inibir efetivamente o desrespeito ao excesso de velocidade nas vias da cidade.

Com o intuito de promover equidade e diminuir desigualdades, os sistemas devem ter implementação e monitoramento regionalizados, idealmente por subprefeituras e distritos, com prioridade para as regiões mais distantes do centro. Como critério da divisão dos recursos financeiros, sugerimos proporcionalidade entre população residente e matrículas escolares.

Sabemos dos desafios jurídicos, como por exemplo regulamentações do CONTRAN sobre a fiscalização da velocidade por trecho, e dos desafios técnicos, porém bastante já avançados em termos de detecção de veículos, pessoas e outros objetos. Por isso, nos colocamos à disposição para debater quaisquer temas pertinentes ao processo e desenvolvimento tecnológico. É tempo de pensar e investir no futuro, sem as amarras de sistemas antigos e com foco em um só tipo de veículo. É tempo de investir em formas de mobilidade mais ativas, sustentáveis e humanas.

Certos da razoabilidade e legalidade do pedido,

Cidadeapé – Associação pela Mobilidade a Pé em São Paulo – CNPJ 31.020.174/0001-40
contato@cidadeape.org

São Paulo, 4 de outubro de 2018.

 


					

SP156 – Atendimento da Prefeitura de SP: por que e como fazer

O SP156 – Portal de Atendimento da Prefeitura de São Paulo é uma ferramenta importante para os munícipes. Por meio dele, podemos fazer solicitações, reclamações e denúncias sobre problemas que encontramos nas ruas, desde árvores maltratadas, até lixo, iluminação, e muito mais.

No nosso caso, é o primeiro canal com a prefeitura para falar dos problemas encontrados em relação ao transporte a pé da cidade: calçadas com buracos, degraus e desníveis, ausência de calçadas, falta de acessibilidade, falta de faixa de pedestres, cruzamento perigoso, velocidade alta demais na via, e muito mais – os problemas que nós, pedestres, encontramos todos os dias.

Por que usar o sistema

Porque temos órgãos responsáveis pela fiscalização na cidade e eles estão aí para isso. Reclamar é fundamental para fazer os serviços públicos melhorarem. E a prefeitura tem obrigação legal de escutar e responder. Isso está estabelecido na Política de
Atendimento ao Cidadão
  da prefeitura de São Paulo (Decreto Nº 58.426/18)

Segundo esse decreto, “cada solicitação deverá gerar um número de protocolo que retrate fielmente a manifestação, permitindo o seu acompanhamento pelo cidadão” e  “os cidadãos serão comunicados quanto ao encaminhamento final dado às suas solicitações.”

Por ser um sistema eletrônico, o SP156 gera automaticamente um protocolo que é encaminhado para o órgão competente. Com isso é possível acompanhar o caso e, se nada for feito, acionar a Ouvidoria do município, que por sua vez obrigará uma resposta por parte do órgão responsável.

O 156, além de registrar pedidos individuais, ajuda a criar demanda para determinados assuntos, gerar estatísticas e alertar os órgãos sobre os problemas.  Se um determinado assunto gera muitos protocolos, a prefeitura é obrigada a fazer alguma coisa. E com nossas cópias de protocolos, podemos pressionar com muito mais propriedade.

Por meio das leis de acesso à informação e suas exigências de transparência, cidadãos, ou organizações da sociedade civil, como a Cidadeapé, podem ter acesso a relatórios sobre as solicitações realizadas pelo 156, por meio do programa Dados Abertos ou do e-SIC.  Podemos então levar esse relatórios e dados para os conselhos participativos, reuniões do CMTT, reuniões dos Consegs, Subprefeituras, etc. Os protocolos e relatórios se tornam uma ferramenta de conhecimento e pressão, com base em dados reais.

Por tudo isso, gostaríamos de estimular que todos realizem solicitações e reclamações por meio do 156 sempre que encontrarem problemas nas calçadas e ruas da cidade. Quanto mais pressão, mais a prefeitura verá a importância do transporte a pé para a mobilidade urbana.

Como fazer uma solicitação pelo SP156

As solicitações podem ser feitas:

Segue um exemplo de como fazer uma denúncia sobre calçada com buraco por meio do Portal de Atendimento da Prefeitura de São Paulo – SP156 .

Mas é possível fazer sobre muitos outros assuntos, tais como:

  • Acessibilidade
  • Bagulhos/grandes objetos (largadas nas calçadas)
  • Buraco: solapamento do passeio
  • CET: circulação de pedestres (para travessias, faixas de pedestres)
  • CET: escola: dificuldade de travessia de alunos
  • CET: Sinalização de orientação de destino
  • Guias/rebaixamento para acessibilidade

Os passos a seguir foram diretamente inspirado no post “Pedestres de Sampa, uni-vos!“, do blog do SampaPé no portal Mobilize:

1. Acesse o SP156:  Portal de Atendimento da Prefeitura de São Paulo – SP156 .

2. Se ainda não tiver um cadastro, é preciso se cadastrar. (apenas os campos com asteríscos vermelhos são obrigatórios). Apenas alguns serviços podem ser realizados anonimamente. Mas nós sugerimos que você  faça a solicitação como cidadã(o) atuante!

3. Na “Carta de Serviços, escolha a opção “Rua e bairro“.

4. Selecione  então “Denúncia de calçada particular irregular, danificada ou inexistente“. No pé da página você pode fazer seu login no sistema.

5. Insira o endereço completo da calçada que gostaria de denunciar e no campo “Descrição” procure especificar o problema: buraco por cause de concessionária, piso quebrado, degrau, piso escorregadio, etc.  Sugerimos acrescentar uma notinha como abaixo e, se for associado da Cidadeapé, incluir essa informação:
“60% dos deslocamentos diários em São Paulo são feitos a pé, mas as calçadas não são de qualidade. Precisamos de investimento nas infraestruturas para a mobilidade a pé. Associado da Cidadeapé –  Associação pela Mobilidade a Pé em São Paulo”.

6. Clique em “Continuar“.

7. Se quiser, pode incluir a foto da calçada ou outro documento pertinente.

8. Depois de indicar que “Não é um robô”, clique em “Finalizar”.

9. Imprima ou protocolo ou salve um PDF. Guarde em seus registros para poder acompanhar a solicitação. Você também receberá um e-mail.

10. Agradecemos se puder nos enviar uma cópia da solicitação para contato@cidadeape.org. Assim saberemos onde já houve denúncia.

11. Suas solicitações podem ser consultadas AQUI. Se tiver se cadastrado, haverá um histórico de todas as suas solicitações e as respectivas respostas.

12. Juntos podemos ter uma cidade mais caminhável!

13. Sempre que tiver um tempo, passe no mesmo lugar para ver se algo foi feito. Se nada foi feito, vale a pena cobrar uma resposta do poder público com o seu número de protocolo.

Vamos pressionar, cobrar e criar estatísticas!

Imagem do post: Rua Embuaçu, Vila Mariana. Sem calçadas. Foto: Google Maps