Propostas para o PIU Minhocão

A Prefeitura iniciou o processo participativo para definição das propostas para o Parque Minhocão e divulgou em 17 de maio a primeira consulta pública online para colher contribuições da sociedade civil. Nessa etapa, a população teve acesso ao diagnóstico preliminar da área a ser requalificada e participar com sugestões ou recomendações a respeito do que deve ser incorporado ao projeto até 14 de junho.

A Cidadeapé, junto com o Instituto de Arquitetos do Brasil – Departamento São Paulo e a Repep – Rede Paulista de Educação Patrimonial, enviou  sugestões para a consulta.

Diante da apresentação do projeto do PIU Minhocão pela Prefeitura e da Lei Municipal nº 16.883/18 reforçamos, em primeiro lugar, os avanços ambientais e urbanísticos contidos na proposta apresentada, em razão da importância da desativação total da circulação de automóveis no Elevado e a democratização do acesso aos espaços públicos da cidade.

É preciso destacar a complexidade que este projeto implica, por ser um território no qual incidem múltiplas dinâmicas sociais, imobiliárias, ambientais, habitacionais, culturais, de mobilidade e de valorização do patrimônio cultural, bem como ampliar o acesso e dar maior transparência ao processo.

Para tal as três organizações sugerem em primeiro lugar a realização de testes de desativação (em momento oportuno, tal como férias escolares) de forma a buscar uma solução democrática e gradual, que permita analisar os impactos no processo de equalização do fluxo de veículos decorrente desta desativação e sem prejudicar o transporte coletivo e o fluxo de pedestres, bicicletas e de outras modalidades de transporte ativo.

Entre os tópicos abordados nas sugestões, estão:

  • Diagnóstico da área
    Análise das transformações no perfil socioeconômico ao longo do tempo, levando em conta também vulnerabilidade social, levantamento de cortiços e pensões e moradores de rua
  • Instrumentos de controle e captura de valorização imobiliária
    Conforme determinado no Art. 4º da Lei Municipal nº 16.833/18 e recomendado pelo Ministério Público sugerimos incluir já neste plano a delimitação de um perímetro de captura
  • Habitação social
    Acreditamos que o projeto deva garantir moradia no entorno imediato do elevado para a população de baixa renda que passou a ocupar os imóveis desvalorizados do entorno desde a sua construção.
  • Mobilidade
    Privilegiar os modos coletivos e ativos de transporte aproveitando a ocasião para implantar uma rede racional e conjunta de transporte ativo e coletivo e, ao mesmo tempo, desencorajar o uso do transporte motorizado individual, melhorando assim a qualidade de vida na região Central.
  • Patrimônio cultural
    O território do Minhocão possui uma série de bens culturais protegidos por lei, mas também um patrimônio vivo que faz parte do cotidiano de diferentes grupos sociais e que ainda não foi reconhecido pelos órgãos de preservação.
  • Segurança urbana e privacidade
    Entendemos que a implantação de “biosites” doados pela empresa TIM à SMSU não cabe ser discutida no conteúdo do PIU Minhocão, bem como seria recomendável à Prefeitura desenvolver, previamente e em fórum mais adequado
  • Governança
    Apresentar modelagens de experiências nacionais e internacionais de gestão compartilhada com a sociedade civil de territórios em que incidem instrumentos de reordenamento urbano, considerando sua relação com os Conselho Gestor do PIU Central, das ZEIS e, eventualmente, da AIU constituída, considerando o marco regulatório existente da cidade de São Paulo.

Ver documento completo com todas as sugestões aqui.

Veja comentários de Conselheiras do CMTT aqui.

Imagem do post: Minhocão fechado no domingo em 2014. Foto: Joel Nogueira/Fotoarena/Divulgação

Dois anos da sanção do Estatuto do Pedestre

Em 13 de junho de 2017 a Câmara Municipal votou o Estatuto do Pedestre, mas a lei que determina melhorias para a mobilidade a pé ainda não foi regulamentada

O Estatuto do Pedestre (Lei Municipal 16.673/2017) foi construído em parceria de vereadores com a sociedade civil, iniciado por um grupo de trabalho liderado pela Comissão Técnica de Mobilidade a Pé e Acessibilidade – CTMPA da ANTP, da qual participaram também Instituto Corrida Amiga, Idec, Cidadeapé e Sampapé, até a aprovação definitiva pelo plenário da Câmara Municipal de São Paulo, em junho de 2017.

À época, comemorou-se essa conquista para sociedade paulistana representada pela aprovação de um documento que visa garantir e consolidar a caminhada utilitária cotidiana (assim como as demais) como modo de transporte que ocorre em rede, ratificando a prioridade do pedestre, já garantida na legislação federal pelo Código de Trânsito Brasileiro (Lei Federal 9.503/97)  e pela Política Nacional de Mobilidade Urbana (Lei Federal nº 12.587/12).

No entanto, apesar da sanção, o Estatuto tem sido sistematicamente ignorado e a lei até hoje não foi regulamentada pela Prefeitura, o que, na prática, inviabiliza a sua aplicação. Enquanto isso não ocorre, os ⅔ da população paulistana que utilizam esse meio de transporte todos os dias continuam com uma infraestrutura insuficiente e insegura.

É preciso com urgência avançar nesse sentido, a começar pela consolidação do conceito de rede de mobilidade a pé – meta estabelecida em 2016 pelo PlanMob/SP (Decreto Municipal 56.834/16). Mas também com a melhoria da conectividade com o transporte público coletivo e a determinação de fontes de recurso específicas para as obras de infraestrutura necessárias ao caminhar tais como calçadas, calçadões, travessias e sinalização, além de indispensável fiscalização.

Ressaltam-se em especial os seguintes itens necessários para a regulamentação e aplicação da lei:

  • Garantir acessibilidade plena e segura dos pedestres ao transporte público coletivo;
  • Compatibilizar os fluxos de pessoas aos equipamentos de transporte público – sejam eles pontos e terminais de ônibus, ou estações de metrô e trem –  para acomodar e priorizar os fluxos a pé tanto nas calçadas como em travessias;
  • Aplicar parte dos recursos do Fundo de Desenvolvimento Urbano (Fundurb) no sistema de mobilidade a pé;
  • Incorporar recursos provenientes de compensações ambientais, compensação de Impacto Ambiental, compensações de Impacto de Vizinhança, compensação de Pólos Geradores de Tráfego para alcançar o objetivo anunciado pela  gestão atual de reduzir o número de mortes no trânsito em 13,7% (de 6,95 para 6,00 mortes para cada 100 mil habitantes);
  • Criar um sistema de informações da mobilidade a pé, com base em pesquisas empíricas e dados concretos, ferramenta básica para definir a adoção de programas e execução de orçamento voltado para o pedestre com base em evidências;
  • Planejar e executar soluções para a mobilidade a pé de curto, médio e longo prazo, extrapolando possíveis interesses e mandatos políticos.

Isso posto, num cenário de recente aumento da letalidade no trânsito, sendo que a maioria das mortes é resultante de atropelamentos, e num contexto em que 66% dos deslocamentos da capital paulista é feito exclusiva ou parcialmente a pé, os signatários desta carta-manifesto reivindicam a aplicação do Estatuto, incluindo fiscalização dessa e demais leis municipais com foco na mobilidade urbana ativa e sustentável.

Assinam:

Cidadeapé – Associação pela Mobilidade a Pé em São Paulo
Corrida Amiga
SampaPé
Pé de Igualdade
Comissão Técnica de Mobilidade a Pé e Acessibilidade da ANTP
Aromeiazero
Mobilize Brasil
Cidade Ativa
IVM _ Instituto Cidade em Movimento
IAB-SP – Instituto de Arquitetos do Brasil/SP
apē – estudo em mobilidade
ITDP Brasil

Veja comentário de Renata Falzoni na CBN aqui. 

Imagem do post: Regina Rocha/ Mobilize

Patinetes elétricos e a mobilidade ativa

Cidadapé se posiciona a respeito dos patinetes como novo modo de transporte  e sua relação com a cidade e os outros modos de deslocamento, sobretudo no que diz respeito aos espaços e prioridades na infraestrutura urbana. 

O uso das calçadas como infraestrutura para a circulação e estacionamento de patinetes elétricos, classificados pela legislação pertinente como equipamentos de mobilidade individual autopropelidos, tem tomado cada vez mais espaço nos debates. Mas é importante lembrar que não se trata apenas de patinetes, trata-se de mais um modo de transporte para a cidades. Para ser eficiente, a mobilidade urbana deve garantir diversidade de opções para realizar os deslocamentos, mas precisa ser sobretudo segura e sustentável. Por isso modos de transporte que ocupam menos espaço e usam energia mais limpa têm prioridade no sistema (cf. PNMU e PlanMob). É necessário melhorar a mobilidade na cidade, preservando a prioridade e a segurança dos mais frágeis. Por isso modos ativos e/ou limpos, como patinetes, são bem-vindos como alternativas de transporte, desde que incorporados ao sistema com segurança e respeito.

O tema dos patinetes ganhou ainda mais repercussão depois de um militar ser atropelado por um carro sobre uma faixa de pedestres enquanto andava de patinete elétrico em 07/05/19 – demonstrando que a fragilidade dos usuários desse veículo se assemelha à de pedestres na cidade. Em resposta, a Prefeitura de São Paulo lançou às pressas um decreto provisório que, entre outras coisas, obriga o uso de capacetes e institui multas para a circulação desses veículos em calçada.

A Cidadeapé se posiciona contra esse decreto que parece ter uma função mais midiática — de mostrar uma aparente capacidade de resposta da Prefeitura a esse suposto problema –, do que efetivamente reduzir conflitos e promover a segurança viária. Os conflitos entre modos de transporte ativos e motorizados são uma das mais importantes questões da mobilidade urbana sendo discutidas com a prefeitura com pouco progresso nos últimos anos, como se observa pelos elevados números de vítimas no trânsito paulistano. É uma discussão que precisa ser feita com seriedade, método e compromisso, e não de forma reativa e imediatista.

A discussão sobre os patinetes em particular teve início em reunião no dia 28 de março, junto às Câmaras Temáticas da Bicicleta e da Mobilidade a Pé (CTB e CTMP). O objetivo era incorporar à regulamentação as reais necessidades dos novos tipos de transporte ativo no contexto da mobilidade paulistana, que ainda não tem infraestrutura apropriada para os modos mais frágeis de deslocamento, em particular a pé e de bicicleta.

Lamentamos que a gestão tenha atropelado o debate, especialmente quando havíamos sido informadas de que haveria discussões públicas antes da publicação do decreto do executivo. De qualquer maneira, estaremos presentes na audiência pública sobre o projeto de lei 01/2019, do legislativo municipal, que propõe regulamentação sobre o Sistema de Micromobilidade Compartilhada, no dia 21/05/2019 a partir das 19h00. Convidamos todos e todas a também participarem!

As raízes dos conflitos

Frente a esse tema, a Cidadeapé ressalta alguns aspectos que deveriam ser levados em consideração quando da regulamentação municipal da operação de novos serviços de transporte: infraestrutura disponível, prioridades de uso das vias (calçadas e ruas) e principalmente a segurança de todos os usuários.

Um dos aspectos se relaciona com a garantia de infraestrutura de qualidade e dos direitos de quem anda a pé.

Segundo padrão definido pela prefeitura de São Paulo para calçadas, elas devem ter uma faixa de circulação e uma de serviços. A de serviços, onde deverá estar posicionado o mobiliário urbano, como rampas de acesso, postes de iluminação, sinalização de trânsito, tampas de bueiro, entre outros, deve ter largura mínima de 70 cm. Já a faixa livre para circulação, com largura mínima de 1,20 m, precisa ser contínua, regular e estar totalmente desobstruída.

Cartilha Passeio Livre: Conheça as regras para arrumar a sua calçada (PMSP)

A faixa livre é o espaço destinado à circulação de pedestres de todos gêneros e idades, inclusive pessoas com todo tipo de deficiência. Na divisão do espaço urbano, estas estruturas que deveriam dar segurança, conforto e eficiência em quase 70% das viagens realizadas diariamente na cidade de São Paulo raramente possuem as qualidades mínimas ou dimensões suficientes para acomodar esse contingente de usuários. Em muitas vias sequer há calçadas. O espaço destinado ao trânsito e estacionamento de veículos motorizados individuais, por outro lado, é bem mais generoso: muito embora sejam responsáveis por apenas 31,2% das viagens diárias da cidade, ocupam ao menos 80% do espaços das ruas (Dados: Metrô: OD 2017).

Ou seja, mesmo que os padrões definidos pela prefeitura estejam de acordo com a Política Nacional de Mobilidade Urbana (PNMU) e o Plano Municipal de Mobilidade (PlanMob), estas definições ainda não saíram do papel. Sem condições de caminhar por calçadas esburacadas, com rampas de acesso a garagens formando degraus, postes e lixeiras atravancando a passagem, não é incomum que pedestres se vejam obrigados a caminhar por onde circulam os automóveis. Esta é uma evidência da demanda urgente por melhores estruturas para caminhar e da necessidade de equalizar suas dimensões, a fim de comportar não só os pedestres mas também a outros tipos de modos de transporte ativos sempre que possível. Sem intervenções significativas nas calçadas, no entanto, é difícil acreditar que as estruturas atuais sejam capazes de atender a uma nova demanda.

Por meio da Resolução 465/13, o Contran estabelece que veículos com as características funcionais e tecnológicas utilizadas pelos patinetes elétricos devem empregar a velocidade máxima de 6 km/h quando circularem em calçadas. No entanto, essa velocidade é superior à velocidade média de quem anda a pé, que pode variar entre 5 km/h e 3,5 km/h, sendo esta a velocidade média de pessoas idosas, com deficiência (PCD) ou restrição de mobilidade. Além disso, os patinetes têm aceleração rápida e um sistema de cobrança por minuto, o que induz seus usuários a desenvolverem as velocidades máximas sempre que possível, podendo atingir 30 km/h. A impossibilidade de fiscalização das velocidades praticadas nas calçadas é mais um agravante, que faz com que na prática os pedestres fiquem sujeitos a dividir o já deficiente espaço das calçadas com pessoas em patinetes circulando a velocidades totalmente incompatíveis.

Por outro lado, é preciso entender por que usuário(a)s de patinete optam por circularem em calçadas em vez de utilizarem a pista junto com os veículos motorizados. Levando em consideração fatores de segurança viária, circular de patinete junto com os carros e motos pode ser muito perigoso e inclusive oferecer risco à vida de seus usuários, como ocorrido no caso do militar atropelado.

Uma discussão abrangente sobre a circulação de patinetes elétricos em calçadas deve levar em consideração ao menos essas questões, a fim de que as soluções possam ser fruto não apenas de critérios técnicos (ou, como neste caso, de reações apressadas), mas também de reflexões que recuperem o histórico de planejamento e de investimento em infraestrutura de mobilidade. Isso porque o acirramento de conflitos relativos à prioridade de uso das calçada não é uma decorrência apenas do surgimento de novas tecnologias em transporte, é principalmente fruto do exíguo espaço destinado às pessoas que se deslocam a pé pela cidade.

A proposta atual não contribui para dar condições realmente efetivas de acomodar o potencial de novos modos de transporte, como os patinetes, e muito menos para preservar a segurança dos pedestres – que continuam sendo o elo mais vulnerável na mobilidade. Assim, mais uma vez, a discussão não deve se restringir somente às características dos equipamentos e limitações de uso, com as responsabilidades pesando apenas sobre as empresas prestadoras de serviços e as pessoas procurando boas alternativas de deslocamento. É essencial  tocar em pontos realmente capazes de acomodar com conforto, eficiência e segurança todos que se deslocam pela cidade, independente do modo, e sobre as responsabilidades do poder público de facilitar a mobilidade urbana e promover a segurança nas vias. Precisamos equalizar os tempos e espaços urbanos, ou seja, diminuir o espaço viário destinado a automóveis, motocicletas e caminhões e as suas velocidades, e restabelecer a prioridade dos modos ativos, qualificando a estrutura para estes.

O que uma regulamentação deveria contemplar?

Em resumo, sugerimos que a regulamentação sobre serviços de compartilhamento de transportes como patinetes deveria contemplar os seguintes aspectos a fim de respeitar a prioridade absoluta a quem se desloca a pé e a segurança de todos:

  1. Acalmamento do trânsito. As áreas onde há maior demanda de viagens por bicicletas e patinetes compartilhados devem ser alvo de ações (de sinalização, geometria e fiscalização) que visem a acalmar o tráfego e reduzir as velocidades desenvolvidas pelos automóveis, a fim de garantir a segurança viária, e de modo que ciclistas e usuários de patinetes possam de fato trafegar pelas vias sem temer por suas vidas.
  2. Uma forma de cobrança que não estimule a velocidade. Ou seja, a regulamentação deveria vedar a cobrança de serviços por minuto, entendendo que isso estimula os usuários a desenvolver velocidades máximas acima do recomendado. A cobrança por distância percorrida pode ser uma opção.
  3. Ocupar espaços de estacionamento nas vias com pontos de apoio. Para evitar o estacionamento de ciclos  (patinetes e bicicletas compartilhadas) em calçadas, que muitas vezes obstruem passagem de pedestres, a Prefeitura deve facilitar a transformação de espaços no leito viário que hoje são ocupados por carros estacionados em pontos de estacionamento para mais tipos de veículos, como bicicletas e patinetes compartilhados, a exemplo do que está fazendo Lisboa. Numa vaga em que cabe apenas um carro, cabem diversas bicicletas e patinetes, ampliando de fato as vagas de estacionamento por veículo ao mesmo tempo em que desestimula o uso de carros.
  4. Restrições para o estacionamento em calçadas. Além de usar os espaços de estacionamento do leito viário, os veículos poderiam estacionar apenas em áreas particulares e na faixa de serviço de calçadas que atendam à largura mínima determinada por lei.
  5. Política de abertura dos dados. Os dados sobre viagens de sistemas de transporte compartilhados são extremamente importantes para os desenvolvimento de políticas de mobilidade urbana. As informações sobre percursos realizados devem ser, portanto, publicizadas pelas empresas responsáveis por esse serviço, de forma a proteger os dados pessoais de seus usuários.
  6. Regulação das áreas de operação. A Prefeitura deve ter a prerrogativa de restringir a operação de serviços de compartilhamento em áreas onde já há saturação de veículos e elevada ocupação das calçadas. E por outro lado estimular a ampliação da cobertura de serviços para áreas com poucas opções de transporte público e coletivo.

Mais sobre o assunto

Imagem do post: Foto: Reuters/BBC

Encontro dos Usuários do Censo 2020 – mobilidade urbana em pauta

Participamos dia 21/11/2018 do Encontro dos Usuários do Censo 2020 promovido pelo IBGE, que tinha como objetivo “identificar as lacunas de produção de dados, estabelecer prioridades e entender como os dados são utilizados, garantindo uma produção estatística de utilidade prática comprovada e honrando o direito do cidadão à informação pública, de acordo com os princípios fundamentais de estatísticas oficiais”.

A Cidadeapé foi convidada a participar do encontro junto com outras entidades graças à carta enviada alguns meses atrás solicitando o aprimoramento  da coleta de dados sobre transporte, com foco no transporte ativo e sustentável e na acessibilidade. Agradecemos a mobilização das organizações parceiras que aderiram a esse importante movimento para levantamento de mais dados sobre  esse tema transversal, que revela informações importantes sobre a situação econômica, demográfica, social e ambiental do Brasil e sua população.

O encontro teve a presença de 60-80 pessoas, a maioria técnicos do IBGE e alguns funcionários de outros órgãos (IPEA principalmente). Das entidades de mobilidade estavam a UCB, o ITDP e Observatório das Metrópoles. Algumas poucas pessoas da sociedade civil fizeram também manifestações.

O balanço é bastante positivo para a mobilidade urbana.

Pesquisa do Entorno

Trata-se do levantamento que recenseadores fazem na face de quadra dos domicílios, para entender como o bairro é servido. Em 2020, passarão a coletar informações sobre travessia de pedestre com sinalização, ponto de ônibus e ciclofaixa/ciclovia/sinalização de pista compartilhada. Isso informará sobre a localização das quadras com pontos de ônibus de todas as cidades do país, assim como ciclovias de todas as cidades do país, quadra a quadra. Em 2010 já estavam inclusas calçadas e as rampas de acessibilidade. A novidade para a mobilidade a pé no próximo Censo é a identificação de faixas de pedestres sinalizadas.

Tempo de deslocamento

A pergunta do Censo se refere ao tempo para a atividade principal de trabalho ou estudo. Nossa solicitação foi de revisar as faixas de tempo, afim de considerar tempos menores, de 6 a 15 minutos e de 16 a 30 minutos, pois este dado é bastante sensível para escolha do modo de transporte. O IBGE optou por coletar a informação com dados abertos de hora e minuto. Assim, ampliam-se as opções de estatísticas e análise de dados, o que é ótimo para entender a parte da mobilidade a pé nos deslocamentos. 

Grau de dificuldade de deficiências

Trata-se de uma pergunta feita no questionário da amostra. Ao que parece pretendem aprimorar as questões para medir melhor o grau de dificuldade para enxergar, ouvir, caminhar e subir escadas. Esperamos dados mais robustos para pautar a acessibilidade nas cidades. 

Modos de transporte

Vão incluir uma nova pergunta sobre modo de transporte no questionário da amostra. Ao responder sobre os modos de transporte que usam para o trabalho e estudo, as pessoas poderão citar até 3 modos utilizados, e vão assinalar o modo principal dizendo em qual deles passa mais tempo.

Conversamos com um dos gerentes do IBGE sobre isso durante a reunião, alertando para o sub-relato do modo a pé. Salientamos que sempre que transporte público ou mais de um modo de transporte são citados, o modo a pé deveria ser anotado. As pesquisas de Origem e Destino costumam registrar os tempos de caminhada na origem e no destino. Vamos continuar em contato para evitar que continuemos a ter dados subestimados sobre o quanto os brasileiros caminham.

De qualquer forma é um grande avanço, e esperamos que a inclusão dessa questão permita que muitos municípios aprimorem seus planos de mobilidade.

Quantificação da posse de veículos

Infelizmente ainda não houve avanço neste ponto. Fizemos uma fala aberta sobre a importância do dado de frota regionalizado para os estudos de emissões de poluentes e políticas gerais de mobilidade. Insistimos que seria importante adicionar uma pergunta sobre o  número de veículos por domicílio, incluindo automóvel, motocicleta e também bicicletas, pois esse dado ajudaria a pautar as políticas de mobilidade por cidades mais sustentáveis.

Próximos passos

Nossa expectativa é manter contato estabelecido com o IBGE e  monitorar as questões relativas ao modo a pé e a posse de bicicleta por domicílio. Vamos acompanhar de perto o cronograma e a fase de testes do Censo 2020. 

Em relação ao cronograma, a consulta pública foi realizada em abril e maio de 2018. Fizeram uma prova piloto em agosto, com as sugestões da consulta. Com as contribuições do encontro de ontem e outras reuniões internas, vão realizar nova prova piloto em março e abril de 2019. O Censo experimental está previsto para outubro de 2019. O Censo 2020 se iniciará em 01/08/2020 com duração máxima de 3 meses.

Agradecemos  a todos que fizeram contribuições no site da consulta pública e que assinaram a carta. É preciso reconhecer que estas vitórias não são fruto da ação da carta especificamente, lembrando que a tentativa de incluir a bicicleta no censo não é inédita. O trabalho para pautar a mobilidade urbana em vários espaços, como tema relevante e transversal que é, vem sendo realizado há anos por organizações ligadas à mobilidade e sustentabilidade. As conquistas são resultados de muito trabalho qualificado, de muitas pessoas, por muito tempo, em rede. 

Sobre o encontro

Encontro com Usuários do Censo 2020 foi realizado dia 21/11/2018, das 9h às 17h30, no Centro de Convenções Sulamérica, Cidade Nova, Rio de Janeiro – RJ. O  IBGE convidou seus principais interlocutores para apresentar o panorama do Censo Demográfico 2020: escopo temático, os testes e demais etapas do planejamento que estão em execução, e ampliar as discussões. 

Agência IBGE Notícias: IBGE apresenta resultados de consulta pública e discute Censo 2020 com sociedade

Vídeo: Encontro dos Usuários do Censo

“Ativistas avaliam novo padrão de calçadas em SP”

Publicado originalmente em: Mobilize Brazil
Data: 17/10/2018
Autora: Regina Rocha

O novo padrão de calçadas que a Prefeitura de São Paulo pretende adotar na cidade, e que foi implantado em caráter piloto em uma área da zona sul da capital – na rua Pedro de Toledo, Vila Mariana -, foi vistoriado por um grupo da Comissão Técnica de Mobilidade a Pé e Acessibilidade da ANTP.

Para a caminhada, o grupo partiu da Pedro de Toledo, esquina com a Napoleão de Barros, e seguiu até a recém-inaugurada estação Hospital São Paulo da linha 5-lilás do metrô. Participaram da ação idosos, pessoas com deficiência visual e pessoas com deficiência física que, ao longo do trajeto, fizeram anotações, avaliações e registros em foto e vídeo de suas experiências.

O novo passeio, definido pela Comissão Permanente de Calçadas do município, apresenta na faixa livre um piso cimentado, bastante liso e regular; e nas bordas – nas faixas de serviço e de acesso – revestimento vermelho com blocos intertravados de concreto.

A execução ficou a cargo da Secretaria de Serviços e Obras, e foi iniciada em dezembro, tendo durado cerca de três meses. O custo orçado foi de quase R$ 1,4 milhão

Impressões in loco

Na vistoria feita pelo grupo da ANTP, a nova calçada mostrou-se tecnicamente bem executada, mas com importantes ressalvas – que no mínimo justificam uma revisão conceitual do padrão adotado – quanto à segurança de quem por lá caminhar. Em primeiro lugar, o grupo observou que, embora o piso seja bem construído, totalmente liso e plano, sem quaisquer ranhuras, textura perceptível ou porosidade, justamente essas características podem provocar, em dias úmidos, derrapagens e portanto uma chance maior de quedas das pessoas. Segundo o relatório do grupo: “No clima úmido ou chuvoso, tanto pela presença de folhas caídas das árvores existentes ao longo da via como pela formação de lâmina de água, o piso facilita a derrapagem e muitos usuários escorregam e sofrem quedas. (…) Esta solução exige que haja limpeza e drenagem constantes e suficientes para manter a superfície apropriada a evitar quedas e escorregões”.

Outro ponto negativo foi a ausência do piso tátil direcional, notada principalmente pelas pessoas cegas do grupo, que se sentiram desorientadas ao longo de todo o percurso. Ao que parece, os blocos intertravados instalados nas faixas de serviço e de acesso foram usados para servir de piso tátil direcional, solução que não se mostrou suficiente nem adequada a tal função. Como aponta o relatório: “…o piso direcional não pode absolutamente ser substituído por soluções com saliência fora do padrão NBR 9050, ainda mais situadas fora da faixa útil da calçada”.

Outro problema que chamou a atenção do grupo, esse de execução, foi a incorreta instalação das tampas de caixas de serviço das concessionárias, que ficaram desniveladas, tornando-se obstáculos perigosos, capazes de provocar tropeções e quedas.

Já no trecho do entorno da estação Hospital São Paulo, o grupo observou que a calçada, de responsabilidade do Metrô, adota outro padrão construtivo, à base de blocos intertravados, um piso diferente que cria descontinuidade na caminhada. Esta despadronização, denuncia o relatório, “compromete o instituído pela NBR 9050 para dar total segurança à pessoa com restrição de mobilidade”.

Confira aqui o relatório completo elaborado pela Comissão Técnica de Mobilidade a Pé e Acessibilidade da ANTP

Imagem do post: Pedestres e cadeirantes testam nova calçada paulistana. Foto: Meli Malatesta

“Guia Global de Desenho de Ruas”, da NACTO

A Cidadeapé endossa o Guia Global de Desenho de Ruas como uma ferramenta eficiente e completa para desenhar ruas e espaços públicos seguros e sustentáveis

Lançado originalmente em 2016, o Guia Global de Desenho de Ruas representa uma nova visão para o desenho de ruas que vai ao encontro dos objetivos dos nossos líderes e dos desejos das nossas comunidades. Agora, a publicação da NACTO-GDCI (em inglês, National Association of City Transportation Officials – Global Designing Cities Initiative) ganha sua versão em português.

Como defensores de uma mobilidade urbana sustentável e resiliente, encontramo-nos hoje em meio a um momento sem precedentes, em que a percepção das pessoas sobre as ruas está em constante e rápida transformação. As pressões da saúde pública e das mudanças climáticas, assim como a tecnologia móvel estão, conjuntamente, reformulando e redefinindo nossa visão de transporte urbano e mobilidade. Ao mesmo tempo, abrem-se oportunidades para inovações que eram inconcebíveis há apenas uma década.

Enquanto nos esforçamos para reagir e nos adaptar a essas necessidades e oportunidades, o Guia Global de Desenho de Ruas oferece uma visão e diretrizes concretas para aumentar a segurança e a qualidade de nossas ruas para pedestres, ciclistas, usuários de transporte público, assim como motoristas.

As ruas demandam uma abordagem integral e equânime que atualmente não é atendida pelas diretrizes convencionais de desenho urbano e geometria viária. A orientação, a visão e a flexibilidade apresentadas no Guia Global de Desenho de Ruas instigam uma nova e importante direção para as cidades. Vemos a publicação como uma ferramenta indispensável no planejamento das ruas de cidades modernas, na medida em que trabalhamos em direção a um objetivo comum com nossos parceiros em todos os níveis de governo e da sociedade.

Página oficial do Guia (em inglês): https://globaldesigningcities.org/publication/global-street-design-guide/

Licitação do transporte público e mobilidade a pé

Cidadeapé contribui com sugestões para o edital de licitação do transporte coletivo em São Paulo ressaltando a importância da mobilidade a pé para quem anda de ônibus

A Cidadepé enviou contribuições para a consulta pública da licitação de ônibus de São Paulo, que acabou em 5 de março, ressaltando a importância de planejar melhor o acesso dos usuários a pé ao sistema municipal de ônibus e, em especial, garantir a acessibilidade nas baldeações. A Cidadeapé colaborou com o edital em parceria com outras entidades, como o Idec, a Cidade dos Sonhos, a Ciclocidade, o ITDP e o Greenpeace.

Segundo a análise da associação, o edital traz avanços para o sistema de ônibus da cidade, mas, como de hábito, as condições de acesso  ao sistema para quem anda a pé são esquecidas. As contribuições da Cidadeapé ressaltaram a importância de pensar o sistema de transporte público como uma rede conectada a outras redes, notadamente à de mobilidade a pé. Destacamos  a importância das calçadas, da localização das travessias, acessibilidade, informação ao usuário e localização dos pontos para a eficiência do deslocamento, o conforto do usuário e a atratividade de mais pessoas ao sistema. Além disso, junto com a Ciclocidade, foi evidenciada a importância de a SPTrans exigir treinamentos que ajudem a melhorar a relação de motoristas e cobradores com pedestres e ciclistas, assim como  obrigar as empresas a terem políticas de prevenção de acidentes e atropelamentos. (Estamos realizando uma pesquisa sobre a convivência entre esses diversos atores do trânsito).

É importante destacar que nenhum usuário se locomove de ônibus sem a necessidade de se deslocar a pé em algum momento. “Ninguém brota no ponto de ônibus” – é o que costumamos lembrar. Por isso, a infraestrutura por onde esses caminhos a pé são realizados deveria ser considerada parte do sistema municipal de transporte público coletivo. Por exemplo, a CET decide a localização dos pontos de ônibus, e muitas vezes acaba colocando-os muito distantes dos locais de baldeação ou integração (por exemplo, corredor perpendicular,  estação de Metrô ou da CPTM), ou longe das faixas de pedestres, obrigando usuários a caminhar distâncias maiores para trocar de condução. É importante que o planejamento da rede leve em conta as necessidades de quem anda a pé e, principalmente, reconheça a diversidade entre os pedestres. O sistema deve ser acessível e confortável a homens e mulheres, de todas as idades, independente de sua condição física.

Com a mudança da distribuição das linhas (a proposta de “nova rede”) que, segundo a Secretaria de Transporte e Mobilidade (SMT), deve ampliar em 4% as baldeações, a preocupação com os deslocamentos a pé se torna ainda mais necessária. Entendemos que não se pode promover mudanças que aumentem as baldeações sem instalar infraestrutura que garanta a acessibilidade dos caminhos entre os pontos de ônibus e a implantação de sinalização com informações aos usuários. Ressaltamos com a Secretaria que é urgente que sejam divulgados:

  • os estudos que embasam a proposta da nova rede;
  • cronograma de alteração das linhas;
  • cronograma de adaptações físicas a serem realizadas ANTES das alterações;
  • protocolo de participação e comunicação com as populações dos bairros ANTES das alterações.

A  Cidadeapé continuará  acompanhando o processo de licitação da cidade e principalmente a discussão das mudanças de linhas, dando sugestões e debatendo as necessidades de quem anda a pé e se desloca pelo sistema junto à SPTrans. Estamos aproveitando todos os espaços de participação social –  como o Conselho Municipal de Transporte e Trânsito – CMTT e a Câmara Temática de Mobilidade a Pé – para exigir que a Prefeitura promova processos participativos e transparentes de consulta sobre as mudanças nas linhas. Se a sua região está se organizando para contestar as mudanças ou tirar dúvidas sobre elas, entre em contato conosco.

Conheça abaixo as principais sugestões feitas pela Cidadeapé.

Planejamento para quem anda a pé

  • A licitação traz diretrizes para as obrigações da SPTrans em vários pontos, mas não menciona questões sobre o planejamento das áreas de embarque e desembarque, calçadas, travessias e localização dos pontos.
  • Os temas de caminhabilidade e acessibilidade estão dispersos no edital, o que dificulta o usuário  avaliar e contribuir.

Acessibilidade

  • As normas de acessibilidade existentes hoje já estão defasadas com relação às tecnologias existentes. Ainda que as normas existentes estejam sendo cumpridas, a Prefeitura poderia ter dado um passo adiante, contemplado novas tecnologias, por exemplo alterando a medida do espaço para cadeira dentro do ônibus contemplando os diferentes tipos de cadeiras motorizadas.
  • Outro avanço que a Prefeitura pode implantar é ampliar a disponibilidade de espaço para cadeiras de rodas na frota para 2 lugares.
  • Falta detalhamento sobre sinalização acessível (sonora, tátil e visual) dentro dos veículos. O ideal é também adotar o padrão dos trilhos, em que todas as paradas são sinalizadas sonoramente, e antecipadamente – um anúncio de qual é o próximo ponto.

Informação ao usuário

  • Junto com o Idec, a Cidadeapé mandou sugestões para ampliar a disponibilidade de informações ao usuário dentro do ônibus e apontou a importância de se melhorar a informação nos pontos, embora esta última esteja ligada a outra concessão já realizada.
  • O edital detalhou algumas das informações sonoras e eletrônicas que estarão presente dentro dos ônibus, e as entidades propuseram algumas melhorias nestas informações, além da ampliação de informações estáticas e permanentes que são de fundamental importância (ou seja, os painéis de informações no interior e exterior dos ônibus e nas paradas).

Treinamento dos motoristas

  • Junto com o Ciclocidade, a Cidadeapé mandou sugestões para melhorar o detalhamento sobre o treinamento de segurança dos motoristas. No conteúdo são de especial importância as questões de gênero, assédio e de segurança na relação com ciclistas e pedestres.
  • Além da contribuição, as entidades têm trabalhado em outras iniciativas para melhorar a qualidade destes treinamentos.

A Cidadeapé vem contribuindo com sugestões para a licitação do transporte público em São Paulo desde 2015. Veja aqui o que já propusemos neste tema.

Imagem do post: Rua Teodoro Sampaio. Idosos e pessoas com problemas de saúde não dispõem de abrigo e nem assentos em ponto de ônibus. Foto: Jornal Cidade Sem Barreiras

“8 Princípios da Calçada”

Publicado originalmente em: WRI Cidades
Autoras: Paula Manoela dos Santos e Ariadne Samios
Data: agosto de 2017

Comentário da Cidadeapé: O WRI Cidades acaba de lançar este guia para construção de calçadas que incorpora os princípios de uma ambiente urbano propício para a mobilidade a pé. A biblioteca da Cidadeapé conta com outros guias e cartilhas interessantes sobre calçadas com abordagens diversas. Confira também.

Andar a pé é a forma mais democrática de se locomover, o modo de transporte mais antigo e o mais utilizado em todo o mundo, além de ser uma forma saudável de transporte – tanto para as pessoas quanto para as cidades. Contudo, a dispersão das cidades, fomentada por décadas de priorização à mobilidade motorizada, e a má qualidade das calçadas desincentivam as pessoas a caminharem.

O guia 8 Princípios da Calçada – Construindo cidades mais ativas sistematiza as referências mais relevantes em uma única publicação sobre construção de calçadas que atendam às necessidades do planejamento urbano, e contempla elementos da calçada, benefícios e recomendações de implantação para que os projetos de infraestrutura para pedestres sejam mais qualificados. Além disso, apresenta exemplos reais ou evidências das vantagens da implantação correta dos elementos.

O objetivo é ampliar a visão da função das calçadas para um espaço que oferece a possibilidade de convivência entre as pessoas. Os princípios ressaltam as características de um ambiente urbano propício para a mobilidade de pedestres, mas também convidativo para que as pessoas se relacionem mais com a cidade. A publicação auxilia gestores e técnicos do setor público, consultores, acadêmicos, lideranças políticas e representantes de movimentos sociais no planejamento e na construção de calçadas qualificadas, a partir de um conteúdo original sobre infraestrutura para pedestres importante para países latino-americanos.

Baixe a publicação completa aqui.

Hospital das Clínicas – Relato de visita com a superintendência de planejamento da CET

Em 21 de Junho de 2017 realizamos uma vistoria no viário do entorno do Hospital das Clínicas para avaliar junto com a superintendência de planejamento da CET a caminhabilidade e acessibilidade do local.
Esteve presente a Rosimeire Leite, do setor de planejamento ativo da CET.

O Hospital das Clínicas é o maior Centro Hospitalar da América Latina e isto o torna um importante polo gerador de tráfego de viagens a pé, por este motivo a área exige cuidados especiais devido às condições de mobilidade das pessoas que frequentam suas instalações.

Durante a visita foram discutidos pontos importantes para a mobilidade a pé como largura de calçadas, estado de conservação do piso, localização de faixas de travessia, rampas de acessibilidade e mobiliário urbano.
Os pontos problemáticos foram principalmente cinco locais: R. Teodoro Sampaio, Av. Dr. Enéas Carvalho de Aguiar, o cruzamento da R. Teodoro Sampaio com Av. Enéas Carvalho de Aguiar e os trechos iniciais da Av. Dr Arnaldo e da Av. Rebouças próximos ao Complexo Viário da Avenida Paulista.

1- Rua Teodoro Sampaio
A Teodoro Sampaio é uma das principais ruas do bairro de Pinheiros e o maior centro de comércio da região. Além do alto fluxo de veículos, possui uma alta frequência de ônibus e um enorme fluxo de pedestres. No entorno do Hospital das Clínicas identificamos que as calçadas da Teodoro Sampaio têm largura insuficiente para a quantidade de pessoas que caminham por lá e, principalmente na quadra próxima a Avenida Dr. Arnaldo, possui poucas travessias. Comprometem ainda mais a situação de insegurança viária pela falta de sinalização a largura excessiva de faixas de rolamento, o que permite que os carros desempenhem alta velocidade.

Portanto, sugerimos a implantação de mais faixas de travessia na interseção da Teodoro com a Dr Enéas, devidamente acompanhadas pelo alargamento das calçadas, solucionando inclusive um trecho crítico onde o fluxo a pé se dificulta sobremaneira pela presença de um ponto terminal de ônibus.

2- Av. Dr. Enéas Carvalho de Aguiar
Esta avenida é a via que cruza internamente o centro hospitalar, atendendo os diferentes hospitais lá instalados. Apresenta um constante fluxo de ambulâncias em serviço e altíssimo fluxo de pedestres entre os hospitais, porém sofre com fluxo de carros e muitos carros estacionados.

A partir desta situação observada, propusemos a implantação de faixas de travessias elevadas (lombofaixas), principalmente na entrada e na saída da avenida, além do alargamento das calçadas junto às faixas de travessia já existentes. Outro ponto importante que precisa ser melhorado é a disponibilidade de informações aos caminhantes sobre a localização dos pontos de interesses – hospitais estações de metrô e ônibus próximos – com a implantação de totens informativos com mapa local situacional.

3- R. Teodoro Sampaio x Av. Enéas Carvalho de Aguiar
São diversos os problemas que o pedestre encontra neste cruzamento.

Como falamos a cima, sugerimos a expansão e melhoramento da ilha central da avenida onde está localizado um ponto de ônibus, além da implantação de faixas de travessia para este canteiro cruzando a Teodoro Sampaio. Com a extensão do canteiro central se pretende melhorar o ponto de ônibus, junto com uma proposta da CET de se implantar mobiliário urbano de permanência para as pessoas que frequentam o local. O ponto de ônibus que hoje está na penúltima quadra da Rua Teodoro Sampaio atrai um alto tráfego de pessoas que a largura da calçada não comporta, seria também realocado para o novo canteiro central, oferecendo mais conforto aos usuários.

4- Complexo viário
O Complexo Viário que liga a Rua da Consolação e as avenidas Paulista, Rebouças e Dr. Arnaldo foi construída na década de 70 seguindo os paradigmas rodoviaristas que predominavam naquela época. A ideia previa uma quantidade maior de vias expressas, mas não foi completamente implementada. O resultado foi um complexo viário expresso, mas pontual, sem nenhuma integração com o entorno, gerando uma região árida e repulsiva para os pedestres. Com impacto principalmente nas avenidas Dr. Arnaldo e Rebouças, estas duas vias possuem neste entroncamento longos trechos sem travessias e com largas faixas de rolamento que possibilitam altas velocidades para os veículos e atrapalham a mobilidade ativa como um todo.

5- Avenida Doutor Arnaldo
A Dr. Arnaldo é um exemplo claro do resultado deste Complexo Viário mal implantado. Há um longo trecho, de 2 Km, com apenas uma faixa de travessia (localizada no cruzamento da Avenida Major Natanael). Com isso, a região fica bastante inóspita e insegura para a grande quantidade de pessoas que caminham por lá, além de obstruir os caminhos, reprimindo demandas de travessias e de circulação de pessoas a pé.
Consequentemente, propusemos para os locais próximos ao Complexo Viário alguns alargamentos de calçadas, implantação de faixa de travessia, realocações de pontos de ônibus, e implantação de lombadas eletrônicas para regulamentar a velocidade.

Indicamos que a faixa de travessia a ser implantada deve ser junto ao primeiro ponto de ônibus da via, que se localiza próximo à Rua João Florêncio, sem comprometer o desempenho veicular uma vez que seria operada no mesmo ciclo semafórico do cruzamento com a Major Natanael, e com boa visibilidade pelos condutores nos dois sentidos. Além da falta de travessia em direção ao Hospital Emílio Ribas, também não há ponto de ônibus correspondente do lado oposto da via, o que complementaria os desejos de viagem dos usuários.
Este trecho necessita também de alargamento de calçada, principalmente no acesso à Av. Rebouças, onde falta também um faixa de travessia que dará acesso à Avenida Paulista. Já a lombada eletrônica proposta seria na saída do túnel e irá induzir motoristas à redução de velocidades e alertar que estão adentrando uma zona especial, com alta presença de pessoas com necessidades especiais que frequentam o centro hospitalar.
Também fomos informados da intenção da CET implantar um bolsão de estacionamento ao longo da alça de ligação da av. Dr. Arnaldo para a Av. Rebouças, indicando ociosidade na largura da via. Por este motivo recomendamos alargamento da calçada no ponto de interseção, reduzindo a extensão a ser atravessada pelos pedestres.

6- Av. Rebouças
A Av. Rebouças tem um problema similar aos descritos anteriormente, e não apresenta nenhuma travessia em todo o seu primeiro quilômetro.
A necessidade da travessia fica evidenciada próximo à passarela que atende Av. Dr Enéas Carvalho de Aguiar. Embora a passarela atenda razoavelmente bem parte dos usuários, a alta quantidade de pessoas que atravessa em nível avenida na altura do cruzamento com Alameda Franca demonstra a necessidade de uma travessia em nível para pedestres neste local. Além disso, este tipo de sinalização ajudaria a conter a velocidade dos motoristas neste trecho inicial da via, que é favorecida principalmente por faixas de rolamento largas.
Também é um ponto com alta permanência de pessoas a pé no canteiro central da Avenida Doutor Enéas Carvalho de Aguiar, onde poderia ser alargada a calçada, implantadas travessias em nível e implantado mobiliário urbano de permanência.

Conclusão
Segundo constatamos, com a presença de representantes da CET durante a visita, essas melhorias além de prover mais segurança, comodidade e praticidade às pessoas que já se deslocam no local iriam favorecer deslocamento a pé, atendendo possíveis demandas reprimidas que hoje evitam circular por essas regiões devido à repulsividade e inospitalidade das vias.

Iremos continuar acompanhando com a CET, no ajuste das proposições para que as melhorias sejam implementadas o mais rápido possível. Desejamos profundamente que estas propostas sirvam como exemplo para diversas outras áreas onde a mobilidade a pé foi ignorada e desestimulada na cidade de São Paulo.

Imagem do post: Gilberto de Carvalho

 

“Como tornar as ruas seguras para pedestres. Uma conversa com a urbanista neozelandesa Skye Duncan”

Publicado originalmente em: Caminhadas Urbanas, Estadão
Autor: Mauro Calliari
Data: 05/05/2017

A diretora da Global Designing Cities Initiative, Skye Duncan, anda pelo mundo pensando em como melhorar a experiência de andar pelas cidades. Ela esteve em São Paulo em 5 de maio para um seminário organizado pela Iniciativa Bloomberg para Segurança Global no Trânsito: Como tornar as ruas seguras para pedestres.

Conversei com ela depois de sua palestra sobre ruas, calçadas e cidades. Skye gosta de caminhar na avenida à beira mar de Wellington, cidade de seu país natal, a Nova Zelândia, mas também encara os becos de Melbourne, na Austrália, e nas ruazinhas de Roma, quando quer “se perder na cidade”.

O papel das ruas na cidade contemporânea.

As ruas ocupam a maior parte do espaço público das cidades. Elas servem para nos movermos para lá e para cá, claro. Mas são muito mais que isso.  São também o lugar onde as crianças brincam, onde adultos encontram vizinhos, onde se celebra em bares, onde se vende mercadorias, onde se experimenta a cidade.  É preciso levar em consideração isso tudo para restaurar o papel da nossas ruas. Para desenhar uma rua, é preciso pensar no ponto de vista das pessoas e no lugar.

Como podemos diminuir o número de atropelamentos e mortes no trânsito? 

A solução passa por duas ações básicas: Diminuir a velocidade dos carros e melhorar o desenho das ruas, das calçadas e travessias. Tudo o mais deriva daí.

Por que há tanta gente falando em segurança? Existe um “Espírito do tempo”?

As mudanças para tornar as cidades mais seguras vêm desde a década de 60, em lugares que hoje são exemplos, como Copenhagen, mas de fato nesses últimos anos as iniciativas estão se proliferando e a quantidade de informações aumentou. O que acontece é que as cidades chegam ao fundo do poço – mortes no trânsito, tempo gasto em congestionamentos e isso faz com que se pense em soluções diferentes. Além disso, as cidades não podem mais não ter planos claros para reduzir a poluição, aumentar o verde, melhorar a andabilidade. Elas competem entre si para atrair e manter moradores e sua vitalidade econômica.

Como convencer pessoas que vale a pena trocar o carro pelo transporte público.

Não há caminho sem conflito. Em Nova York, quando a secretária de transporte decidiu fechar a Times Square acharam que ela estava louca. Mas deu certo e hoje a praça fechada para carros é um paradigma seguido por muitas cidades ao redor do mundo.

As cidades de países desenvolvidos estão dificultando a vida de quem vai de carro ao centro. Mas, por outro lado, quanto mais fácil for andar, pedalar e o transporte público, maior o número de pessoas que decidirão não pegar o carro.

Andar como fruição ou como necessidade.

Mesmo que o andar seja um meio de transporte, é possível combinar isso com uma boa experiência da cidade. Se você puder escolher o caminho a cada vez, se puder ter diferentes tipos de ruas e de construções, isso torna o trajeto mais agradável e pode até se transformar num passeio prazeroso.

Antes e depois. Ruas que melhoram a experiência do pedestre nos Estados Unidos.

Andar transcende a política partidária. É da vida de pessoas que estamos falando”. 

Normalmente, o papel dos prefeitos é justamente apontar um caminho para melhorar a cidade. Mas, mesmo que haja alguma falta de clareza, estamos falando de salvar vidas. Se nós desenharmos uma cidade que facilite a decisão de andar a pé ou de bicicleta, o prefeito fará parte desse movimento, naturalmente. Dá trabalho fazer o engajamento de todos. É preciso vontade, expertise, informação e muitos dados. Mas vale a pena. Com legitimidade e discussão anterior, “os projetos são cumpridos com muito mais facilidade no longo prazo”.

Quem pensa no pedestre nos órgãos de trânsito?

Cada cidade tem uma estrutura , mas o importante é que exista um grupo com diversidade ajudando a tomar as decisões. Além dos engenheiros, é aconselhável que os órgãos de trânsito tenham especialistas em acessibilidade, pedestres, ciclistas e crianças, ambientalistas, etc. Conselhos de moradores servem para dar consistência aos projetos e ajudar a pensar em questões que só quem conhece a região consegue.

Trãnsito Induzido.

O conceito é conhecido, mas a gente sempre desconfia. “Não importa o quanto se aumente no espaço para carros. Logo, ele estará tomado e o congestionamento volta”.

A importância de medir.

“What you don´t measure, you don´t execute”. A frase de Bloomberg, comum no ambiente de negócios, é válida para o poder público. É fácil pensar em exemplos aqui. Quando as ciclovias foram implantadas, algumas pessoas reclamaram de que o movimento de lojas iria cair. Ninguém mediu as vendas antes e depois. O resultado é que não sabemos se houve ou não variação. Como tomar decisões assim?

Eficiência no transporte.

O paradigma mudou. Não devemos mais pensar em quantos carros passam por tal lugar por hora, mas sim quantas pessoas. Isso inclui pedestres e passageiros em ônibus e muda dramaticamente a clareza no que deve ser prioridade.

Visão Zero.

Visão Zero é uma idéia que muda o jeito de ver o trânsito.  No momento em que uma cidade decide que morrer no trânsito não é aceitável, o que era custo passa a ser investimento. As prioridades ficam mais claras.

Evento Como tornar as ruas seguras para pedestres

Mobilab – São Paulo, SP
05 de maio de 2017, 08h30-12h
Iniciativa Bloomberg para Segurança Global no Trânsito

Outras apresentações mostradas durante o evento e materiais utilizados na oficina da tarde:

Imagem do post: Nacto Urban Street Desing Guide