Por muitos anos, o planejamento urbano voltado para o transporte sobre rodas e o culto ao automóvel afastaram o urbanismo e a arquitetura daqueles que mais importam nas cidades: as pessoas. A crise global ligada à Covid-19 desafiou tudo e todos, e escancarou a necessidade de mudar os nossos paradigmas, especialmente sobre a maneira como percorremos diariamente a cidade. Nunca se mostrou tão necessário lutar por cidades mais inclusivas, transportes públicos de qualidade, ciclovias, ruas arborizadas com calçadas generosas.
No Brasil, tivemos as eleições municipais e vimos a pauta da mobilidade sustentável ganhar um espaço inédito no debate político. Aproveitamos essa oportunidade para tentar pautar boas propostas para o tema. Atuamos não apenas em São Paulo, mas também em uma articulação nacional que estimulou outras organizações da sociedade civil a fazer o mesmo. Agora nos preparamos para acompanhar e pressionar mais uma gestão municipal por políticas que efetivamente priorizem a mobilidade a pé.
Destaques do ano
Iniciamos o ano lançando nossa nova identidade, que reflete com mais clareza a missão de defender políticas públicas para que todas as pessoas tenham o direito de andar a pé com segurança, conforto e qualidade, independente de gênero, raça, idade, condição física ou socioeconômica. É sempre bom relembrar no que acreditamos para fortalecer nossa ação no mundo.
Em Fevereiro nosso colaboradores se encontraram para definir as prioridades da Cidadeapé em 2020. Só não contávamos com uma pandemia no meio do caminho.
Já atentos aos efeitos das restrições impostas pela crise desencadeada pela Covid-19 na mobilidade urbana, no final de Março fomos um dos signatários do documento endereçado à Secretaria de Transportes Metropolitanos (estadual) e na Secretaria de Mobilidade e Transportes (municipal). Encabeçado pela Ciclocidade, o posicionamento sugeria medidas imediatas ao Estado e à Prefeitura de apoio aos trabalhadores que precisam usar bicicleta nesse momento de pandemia.
Também passamos a fazer parte da rede Pacto pela Democracia – uma plataforma de ação conjunta, que conta com 100 organizações da sociedade civil, além de lideranças públicas e políticas de diversos campos.
Em Abril, assinamos junto a 35 organizações da sociedade civil o posicionamento sobre a necessidade de um Programa Emergencial do Transporte Social, com o objetivo de reduzir os impactos da pandemia de Covid-19 sobre os sistemas de transportes durante a pandemia no Brasil.
A pauta foi levada em Maio ao Conselho Municipal de Transporte e Trânsito. A Cidadeapé apoiou a ação de conselheiros, que protocolaram um documento direcionado a autoridades paulistanas com contribuições sobre propostas e medidas possíveis ou adotadas relativas à mobilidade urbana para manter o isolamento social necessário,
Também juntamos forças com organizações como IAB SP – Instituto de Arquitetos do Brasil – São Paulo, Ciclocidade, Instituto A Cidade Precisa de Você, Aromeiazero, Corrida Amiga, Metrópole 1:1 e Cidade Ativa em mobilização articulada pelo SampaPé intitulada Ruas para a mobilidade ativa durante a pandemia. O objetivo é pressionar a Prefeitura de São Paulo para abrir espaço nas ruas para as pessoas se deslocarem a pé e de bicicleta em segurança, como já está sendo feito em várias partes do mundo.
Em Junho foi possível dar foco a outro assunto não menos importante: a desigualdade no Brasil. Realizamos um levantamento de raça e gênero entre associadas e associados e também assinamos o manifesto da Coalizão Negra por Direitos.
A Cidadeapé, o ComoAnda e a Ciclocidade formaram uma coalizão para poder coletar e sistematizar os comentários de seus colaboradores a respeito do Manual de Desenho Urbano e Obras Viárias da cidade de São Paulo. Enquanto aguardamos o lançamento do Manual, você pode acompanhar os resultados dessas contribuições no nosso site.
Em Julho, tivemos uma conquista importante. A ação civil pública movida em 2017 pela Ciclocidade e apoiada pela Cidadeapé recebeu parecer favorável do MPF enquanto aguarda julgamento pelo Superior Tribunal de Justiça. Ação questiona adequação de medida de aumento de limites de velocidade nas marginais Tietê e Pinheiros.
Em Agosto, Dia Mundial do Pedestre, elegemos nova diretoria. Devido à pandemia, todo o processo de mudança de gestão foi realizado remotamente, com direito a brinde e desejos de sucesso.
O novo corpo diretivo estreou com comemorações. Depois de uma espera de 3 anos, finalmente o Estatuto do Pedestre foi regulamentado. E a iniciativa Ruas para a mobilidade ativa abriu espaço para a Cidadeapé, junto com o Sampapé e o Aromeiazero, na condução de oficinas participativas para avançar nas transformações das ruas em resposta à pandemia. Embora sejam avanços importantes com alguns bons frutos (veja os resultados das primeiras intervenções aqui), tudo evolui a passos muito lentos e será crucial estar atento a suas evoluções no próximo ano.
Outro desafio colocado à nova diretoria foi a fiscalização do andamento do Programa Emergencial de Calçadas. O Programa, que visa construir e requalificar calçadas de áreas com grande fluxo de pessoas, vem sendo executado, foi retomado após um hiato de anos sem executar obras de requalificação de calçadas. Acessar publicamente os dados de acompanhamento da execução continua sendo um desafio e 2021 iniciará com a demanda de avaliação do cumprimento da meta estipulada.
Já em clima das Eleições Municipais, sete organizações da sociedade civil lançaram a “Agenda Propositiva para a Cidade de São Paulo: Mobilidade e Clima“. A publicação é um conjunto de propostas direcionado às candidaturas à Prefeitura e ao Legislativo municipal, com o objetivo de pautar o debate eleitoral sobre mobilidade urbana.
Em Setembro, mais uma vitória da sociedade civil. O Tribunal de Justiça manteve a medida que determinou a suspensão do processo de alteração da lei de zoneamento (lei municipal nº 16.402/2016). A ação foi promovida por 5 entidades e apoiada por mais 150, entre elas a Cidadeapé.
Em Outubro, mais uma contribuição coletiva, desta vez para a consulta pública Espaços Públicos para a flexibilização, que trata do decreto que revê as normas de ocupação de calçadas e ruas por mesas de bares e restaurantes. A norma, no entanto, ainda não chegou a ser publicada.
Sem dúvida um dos grandes destaques do ano foi nossa atuação na campanha Mobilidade Sustentável nas Eleições. A Cidadeapé, juntou-se a entidades da sociedade civil que atuam em defesa da mobilidade ativa e do transporte público, com o objetivo de reunir e apoiar organizações de todo o Brasil para sensibilizar os candidatos às eleições municipais de 2020. Com o apoio da campanha, dezenas de entidades de todas as regiões do país se mobilizaram para colocar a prioridade à mobilidade ativa e coletiva na pauta eleitoral.
Aqui em São Paulo, a Cidadeapé também atuou nesse sentido, junto com a Rede Mobilidade e Clima, debatendo e avaliando propostas e cobrando compromissos com a mobilidade sustentável. Como resultado, seis das vereadoras e vereadores eleitos assinaram a Carta-compromisso criada pela Rede, assim como o prefeito reeleito Bruno Covas. Isso significa que temos um instrumento a mais para dialogar com esses representantes e cobrar deles ações contundentes em benefício da mobilidade sustentável [..]
Por fim, finalizamos esta retrospectiva com uma homenagem à nossa amiga e ativista Marina Harkot que teve sua vida interrompida pela violência no trânsito. Sua obra, marcada pela luta por cidades mais justas e seguras, é um legado que nos inspira a continuar caminhando em 2021.
2021 tá ai. Seguimos juntos.